oestadoacre reproduz Luis Nassif, que analisa o projeto em andamento da ferrovia bioceânica da Bahia-Goiás-MT-RO e Acre até Chancay, no Peru.
— No meio do caminho da transoceânica, há dois capitães da reserva, Tarcísio de Freitas e Jair Bolsonaro, capazes de bater continência para a bandeira norte-americana (Luis Nassif)
A super ferrovia bioceânica, certezas e dúvidas
Por Luis Nassif, do GGN – O sonho da grande ferrovia ultrarrápido, varando o país de leste a oeste, está caminhando a passos mais largos do que em outras épocas, graças à entrada do fator China. Daí a relevância do encontro anual do Banco do BRICS, que começou ontem no Rio de Janeiro.
A rota prevista parte de Ilhéus (BA), percorre FIOL → FICO → até a divisa com o Peru (via Acre/Tocantins), integrando ao corredor bioceânico com destino ao Porto de Chancay (Peru).
O traçado sul foi escolhido para evitar a Amazônia, reduzindo impactos ambientais e riscos sociais .
Entre os dias 15 e 17 de abril de 2025, uma delegação de engenheiros do governo chinês e da China State Railway Group, empresa ferroviária estatal do país, realizou uma visita técnica ao Brasil. A missão inspecionou locais estratégicos, como o canteiro de obras da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (FIOL), na Bahia, e o entroncamento com a Ferrovia Norte-Sul, em Goiás. O objetivo era avaliar a infraestrutura existente e coletar dados para um novo estudo de viabilidade da construção da ferrovia em solo brasileiro.
Apenas um mês depois, foi a vez do Brasil ir à China. Entre 10 e 13 de maio de 2025, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a ministra do Planejamento, Simone Tebet, lideraram uma delegação de alto nível a Pequim.
Durante a viagem à China, o governo brasileiro estabeleceu um prazo para uma resposta definitiva sobre o investimento. A expectativa, segundo a ministra Tebet, era receber um compromisso formal da China até a Cúpula dos BRICS, que estava marcada para ocorrer no Rio de Janeiro em julho de 2025. O senso de urgência demonstrou a prioridade que o projeto conquistou na agenda do governo.
O passo seguinte será a assinatura de acordos definitivos e início dos estudos de engenharia.
O Brasil espera “resposta definitiva” da China até a Cúpula dos BRICS em julho de 2025. Depois, o projeto deve levar de 5 a 8 anos para implantação.
Mas há o interesse norte-americano. Recentemente, em entrevista à Fox News, o Secretário de Defesa norte-americano, Pete Hegseth, se referiu às Américas do Sul e Central como “quintal” dos Estados Unidos ao reclamar da influência da China na região. “É estratégico. O governo (Barack) Obama tirou os olhos da bola e deixou a China tomar toda América do Sul e Central, com sua influência econômica e cultural, fazendo acordos com governos locais de infraestrutura ruim, vigilância e endividamento. Presidente Trump disse ‘não mais’, vamos recuperar o nosso quintal”, disse Hegseth.
No meio do caminho da transoceânica, há dois capitães da reserva, Tarcísio de Freitas e Jair Bolsonaro, capazes de bater continência para a bandeira norte-americana. Nas redes sociais, Tarcísio celebrou a posse do ex-presidente Donald Trump, compartilhando vídeos do político americano com legendas otimistas, incluindo a hashtag #MakeAmericaGreatOnceAgain.
As ressalvas à ferrovia
De qualquer modo, há críticas técnicas à viabilidade da ferrovia, que merecem ser analisadas. É o caso do documento da UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro), “Corredor Bi-Oceânico: Mistificação Fraudulenta”, de Eriksom Teixeira Lima.
As primeiras críticas são em relação a premissas erradas ou omitidas pelos estudos técnicos. Segundo Lima, muitos defensores da bioceânica fazem comparações usando distâncias rodoviárias, ignorando a disponibilidade ou viabilidade de ferrovias existentes, como a Ferrovia Norte-Sul, Ferrovia de Integração Oeste-Leste, a Ferrogrão e outras, apesar de sua relevância logística para o Atlântico.
Na comparação doce distâncias, a rota para Santos é mais curta e mais rápida, mesmo considerando limitações portuárias. E a bioceânica exigiria obras complexas e caras em países andinos (como novas ferrovias no Peru e Bolívia), que ainda não existem.
Distâncias comparadas (estimativas do estudo):
Rota | Distância Terrestre | Tempo Estimado |
Rondonópolis → Pacífico via RO/AC → Cusco | 4.200 km | 63 horas |
Rondonópolis → Pacífico via La Paz | 3.400 km | 57 horas |
Rondonópolis → Santos | 1.600 km | 22 horas |
Rondonópolis → Vitória | 2.100 km | 30 horas |
O ponto central de dúvida é a quantidade de obras necessárias para viabilizar a bioceânica.
Distâncias comparadas (estimativas do estudo):
Rota | Distância Terrestre | Tempo Estimado |
Rondonópolis → Pacífico via RO/AC → Cusco | 4.200 km | 63 horas |
Rondonópolis → Pacífico via La Paz | 3.400 km | 57 horas |
Rondonópolis → Santos | 1.600 km | 22 horas |
Rondonópolis → Vitória | 2.100 km | 30 horas |
A conclusão do autor é que a rota para Santos é mais curta e mais rápida, mesmo considerando limitações portuárias, e a bioceânica exigiria obras complexas e caras em países andinos (como novas ferrovias no Peru e Bolívia), que ainda não existem.
Condições para a viabilidade da Ferrovia Bioceânica
Categoria | Condição necessária |
Infraestrutura ferroviária no Brasil | Conclusão da ferrovia de ligação de Rondonópolis a Corumbá, com padrão exportador (bitola, sinalização etc.) |
Integração internacional | Acordos trilaterais operacionais com Bolívia e Peru para garantir conexão interoperável até Chancay |
Obras andinas (Bolívia/Peru) | Construção ou modernização de ferrovias nos Andes peruanos e bolivianos, com padrão logístico internacional |
Conexão portuária eficiente | Capacidade real do Porto de Chancay de operar cargas brasileiras em larga escala, com competitividade de tarifas |
Segurança jurídica e aduaneira | Integração alfandegária e garantias de livre trânsito, inclusive em contextos políticos instáveis |
Atratividade financeira | Redução comprovada de custos logísticos por tonelada, especialmente para grãos, minérios e carnes |
Financiamento e governança | Modelos de PPP ou financiamento internacional (ex: BNDES, NDB, AIIB) para cobrir lacunas de investimento |
Sustentabilidade socioambiental | Licenciamento viável, compensações ambientais e diálogo com comunidades locais ao longo do traçado |
A partir daí, o estudo mostra investimentos alternativos.
Alternativa | Descrição | Vantagens |
Ferrovia Norte-Sul + Santos/Itaqui | Linha ferroviária em expansão e operação no eixo TO-GO-MG até Santos ou Itaqui (MA) | Infraestrutura existente, conexão portuária forte |
Arco Norte (BR-163 + Miritituba) | Integração rodoviária com barcaças pelo Tapajós e portos do norte | Baixo custo de exportação e menor distância ao mar |
Malha Sul + Paranaguá/Itajaí | Transporte ferroviário desde MS/PR/SC até o sul do país | Boa conexão com agroindústria do Sul |
Multimodal centro-norte (FIOL + FICO) | Em obras: conecta oeste baiano ao porto de Ilhéus (via FIOL e FICO) | Excelente para o Matopiba, prazo médio |
Cabotagem + interiorização (BR do Mar) | Uso de cabotagem e transporte até portos do Sudeste/Norte | Baixo custo, investimento incremental |