AGU – Advocacia-Geral da união (AGU) e o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) enviaram hoje (18/10) pedido de providências ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ), solicitando ao órgão que oriente os magistrados de todo o país a terem mais cautela na análise de pedidos de liberdade provisória e de progressão de regime de integrantes de facções criminosas. O requerimento sugere ainda que seja evitada a concessão desses benefícios por decisões monocráticas em regime de plantão judiciário.
Assinada pelo advogado-geral da União, Jorge Messias, e pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, a peça traz pedido de concessão de medida cautelar (urgente), e argumenta que a providência é necessária para, entre outros aspectos, evitar a fuga e o cometimento de novos crimes por membros dessas organizações.
A AGU e o MJSP destacam que, na atualidade, há uma “profusão de decisões monocráticas, em matéria criminal, que favorecem indivíduos do alto escalão de organizações criminosas, especialmente decisões que revogam prisões cautelares ou concedem progressão de regime a líderes de organizações e facções criminosas, além de narcotraficantes e chefes de milícias”.
O documento menciona várias decisões nesse sentido. Uma delas foi a tomada por desembargador do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia (TJBA), durante plantão judiciário, que concedeu prisão domiciliar a Ednaldo Freire Ferreira (Dadá), fundador e líder da facção baiana Bonde do Maluco. O benefício foi rapidamente revogado pela Segunda Câmara Criminal da Corte, mas Ferreira já havia sido solto e fugiu.
Outro caso, de grande repercussão, foi a concessão de liminar em um habeas-corpus pelo ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Marco Aurélio Mello. Tomada em outubro de 2020, a decisão monocrática resultou na liberdade de André Oliveira Macedo (André do Rap), suspeito de liderar a facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC). A liminar foi suspensa pouco tempo depois pelo então presidente da Corte, ministro Luís Fux, mas o criminoso fugiu do país. O mérito da ação foi julgado pela Primeira Turma do STF no mês seguinte, que indeferiu a ordem.
Segundo os autores, situações como as mencionadas, além gerar efeitos prejudiciais aos processos em tramitação, por dificultar ou inviabilizar a aplicação da lei, “causam instabilidade social e descrédito a todos os órgãos que compõem o sistema de justiça. Julga-se necessário, portanto, que este Conselho Nacional de Justiça enfrente a situação e apresente recomendação ou ato normativo que oriente e vincule as instâncias judiciais”.
Cadastro de integrantes de organizações criminosas
No pedido, AGU e MJSP solicitam também ao CNJ a criação de um Cadastro Nacional de Pessoas Condenadas por Integrar Organização Criminosa, nos mesmos moldes de outro repositório informativo semelhante criado pelo conselho: o Cadastro Nacional de Condenados por Ato de Improbidade Administrativa e por Ato que implique Inelegibilidade (CNCIAI).
AGU e MJSP ressaltam que o pedido de providências não tem o objetivo de discutir as razões expressas nas decisões judiciais. Esclarecem que o propósito é tão somente sensibilizar o Conselho a avaliar a emissão de orientação para o adequado tratamento do assunto, sem desconsiderar a necessidade de apuração disciplinar de eventual atuação inadequada de magistrados. “O entendimento da União é que decisões que envolvam a soltura ou a concessão de benefício a indivíduos perigosos que conhecidamente ocupam o alto escalão de organização criminosa devem ser prolatadas com a máxima cautela, sempre que possível pelo órgão colegiado competente para tanto e que apenas fundamentos de urgência excepcional possam ser conhecidos em plantão judiciário”, explicam no pedido.
Os autores lembram no pedido que a Constituição Federal (art. 103-B, § 4º) atribuiu ao CNJ a competência para controle da atuação administrativa e financeira do Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, cabendo ao órgão, além de outras providências, zelar pela racionalização e transparência da administração judiciária. Por fim, citam precedente do STF (Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 4.638/DF) que estabeleceu o entendimento de que a competência do conselho não se restringe à apuração de infrações disciplinares, abrangendo também as funções normativa e fiscalizadora.