Trump e o protecionismo 2.0: impacto global e o papel do Brasil

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(oea)

Por Sérgio Rodrigues e Sandro Prado

O protecionismo de Trump, a guerra comercial global e o Brasil

O retorno de Donald Trump ao governo dos Estados Unidos, em 20 de janeiro de 2025, e sua política de ultra direita autoritária nacionalista reacendem preocupações sobre os impactos das políticas protecionistas norte-americanas em um contexto de uma economia global interconectada.

Com a recente imposição de tarifas de 10% sobre os produtos chineses enviados para os EUA e a retaliação da China com tarifas de 15% sobre carvão e gás natural liquefeito, além de 10% sobre petróleo bruto e máquinas agrícolas, o mundo observa atentamente os desdobramentos dessa disputa comercial.

Em seu discurso no Fórum Econômico Mundial, Trump reiterou seu compromisso com uma agenda protecionista, incluindo tarifas sobre produtos vindos da China, União Europeia, México e Canadá. Apesar disso, as medidas contra o México e o Canadá foram postergadas para março, enquanto as tarifas contra a China já entraram em vigor.

Os Estados Unidos são o nosso segundo maior parceiro comercial, com destaque para exportações de bens da indústria de transformação. Esses setores, que respondem por 78% das vendas brasileiras aos EUA, são vulneráveis a restrições tarifárias. O histórico de políticas comerciais de Trump mostra que produtos com valor agregado, como itens metalúrgicos e siderúrgicos, devem ser alvos de sua política protecionista.

A imposição de tarifas reduz a competitividade dos produtos brasileiros no mercado americano, transferindo parte do custo adicional para os exportadores. Esse efeito é amplificado pela possível valorização do dólar, reduzindo as receitas em moeda local. No entanto, a recente desvalorização do dólar e a incerteza sobre a implementação dessas tarifas, oferece um alívio momentâneo ao nosso país. Para a balança comercial brasileira, isso significa a possibilidade de mantermos em 2025 o bom superávit que tivemos em 2023 e 2024, enquanto medidas concretas, de retaliação tarifaria a produtos importados do Brasil não são adotadas por Trump.

Embora os Estados Unidos sejam um parceiro estratégico, a China permanece como o maior destino das exportações brasileiras, respondendo por 28,6% do total em 2024. A escalada das tensões comerciais entre China e EUA pode impactar diretamente o Brasil. Caso a economia chinesa desacelere devido à guerra comercial, a demanda por comodities brasileiras, como soja, minério de ferro e petróleo, pode cair, pressionando a nossa balança comercial. No entanto, as tarifas impostas pela China sobre o petróleo norte-americano podem abrir espaço para que aumentemos nossa participação no mercado chinês. Em 2024, exportamos em média 720 mil barris diários para a China, e essa demanda pode crescer como alternativa às exportações norte-americanas.

Outro aspecto central dessa disputa é a guerra tecnológica. A recente queda das ações da Nvidia em US$ 600 bilhões, devido ao avanço da startup chinesa DeepSeek no setor de inteligência artificial, evidencia o impacto das restrições comerciais sobre a liderança tecnológica americana. Apesar das sanções impostas pelos EUA sobre a exportação de semicondutores para a China, empresas chinesas demonstraram capacidade de inovação mesmo sob restrições. Isso reforça o argumento de que barreiras comerciais podem ser ineficazes diante da crescente autonomia tecnológica chinesa.

A aplicação de maiores tarifas a parceiros comerciais e o consequente aumento de preços domésticos nos EUA, causará inflação, forçando o FED a manter ou mesmo aumentar as taxas de juros por períodos prolongados. Essa política monetária restritiva aumenta a atratividade dos ativos americanos, levando à migração de capitais para os EUA. Países emergentes, como o Brasil, enfrentariam maiores dificuldades para atrair investimentos externos, agravando significativamente a volatilidade cambial e os custos de financiamento.

Os desdobramentos das políticas protecionistas americanas exigem uma resposta estratégica do Brasil. Uma diversificação de mercados e uma maior integração em cadeias globais de valor são medidas essenciais para mitigar os riscos de dependência excessiva de poucos parceiros comerciais.

Políticas de incentivo à inovação e agregação de valor às exportações podem aumentar a competitividade dos nossos produtos no cenário internacional. Nesse contexto, o papel de uma maior aproximação com o BRICS e o mercado latino-americano é fundamental, além de explorar as oportunidades geradas pela recente desvalorização do dólar e o espaço diplomático para renegociar barreiras comerciais antes que sejam efetivamente aplicadas.

Embora a dependência econômica do Brasil em relação aos Estados Unidos permaneça significativa, avanços na diversificação de parceiros comerciais e no fortalecimento de novas frentes diplomáticas são importantes para reduzir a vulnerabilidade do país a medidas unilaterais de outras nações.

A ampliação das relações com economias emergentes, a busca por acordos multilaterais e o investimento em cadeias globais de valor podem consolidar a nossa nação como um player de relevância no cenário mundial. A construção de uma política externa mais autônoma e estratégica é essencial para podermos não apenas resistir às oscilações do comércio internacional, mas também aproveitarmos oportunidades para nos afirmarmos como uma potência econômica global.

(Sérgio Rodrigues e Sandro Prado)

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