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Imunidade de grupo pode nunca ser alcançada, nem com 70% de vacinados
Revista Nature aponta cinco razões que quase impossibilitam a imunidade de grupo. Peritos portugueses confirmam obstáculos.
A tão ansiada imunidade de grupo de que se fala há um ano, desde o início da pandemia, arrisca-se a ser um objetivo impossível de alcançar e há várias razões para que nunca aconteça.
O receio dessa provável impossibilidade é apresentado pela Nature, uma revista especializada em ciência, e é subscrita por peritos portugueses contactados pela TSF.
A Nature indica cinco razões, a começar pelas incertezas que existem sobre a capacidade das vacinas para evitar a transmissão da Covid-19 – mas não de evitarem o desenvolvimento de sintomas e especialmente de sintomas graves.
Depois, há ainda as dificuldades de produzir rapidamente vacinas para distribuir por todo o mundo, que todos aceitem receber a vacina, o surgimento de novas variantes e as incertezas sobre o tempo que durará a imunidade de cada pessoa vacinada ou que já teve a infeção de forma natural.
O presidente da Sociedade Portuguesa de Virologia admite que os argumentos anteriores fazem sentido. Paulo Paixão explica que “o conceito de imunidade de grupo diz-nos que, se atingirmos um determinado patamar, as outras pessoas ficam protegidas porque o vírus vai deixar de circular, mas este é um conceito que dificilmente se aplica aos vírus respiratórios e o melhor exemplo é a gripe”. “Para mim, não é novidade a ideia de que o vírus não vai deixar de circular quando tivermos 70% ou 80% da população imunizada, porque não vamos conseguir bloquear, totalmente, a circulação do vírus”, refere.
O caso de Israel
O virologista dá o exemplo de Israel, onde os tais 70% estão quase alcançados, mas os novos diagnósticos continuam em alta – bem acima da incidência atual em Portugal -, apesar de se notarem menos efeitos graves e muito menos mortalidade.
“É perfeitamente natural que o vírus continue a circular e, obviamente, quanto mais vacinarmos menos, o vírus vai circular, mas bloqueá-lo, totalmente, não acredito”, afirma Paulo Paixão.
A presidente da Associação Portuguesa de Epidemiologia admite que, depois de termos 70% da população vacinada, o coronavírus vai certamente continuar a circular, mas sublinha que acabar com essa circulação não é o objetivo da imunidade de grupo. Elisabete Ramos defende que a meta deve ser ter poucas pessoas “suscetíveis a ficarem doentes”, para não colocar em causa a resposta dos cuidados de saúde.
Países não vivem fechados
Segunda a epidemiologista, não será uma tradicional imunidade de grupo, mas uma imunidade que evite os efeitos mais graves da Covid-19, que dificilmente será eliminada por completo.
A especialista em epidemiologia sublinha igualmente o “problema relevante relacionado com o facto de nuns países a doença vir a estar controlada com a vacinação e noutros não, o que gera uma altíssima probabilidade de que existam novas variantes que ultrapassam a imunidade de quem foi vacinado”.
“É preciso pensar que as comunidades não estão fechadas dentro de fronteiras físicas e que aquilo que acontece a nível local acaba por ter impacto no resto do planeta”, avisa Elisabete Ramos.
A presidente da Associação Portuguesa de Epidemiologia acredita que, com 70% dos portugueses vacinados, poderemos voltar, “em alguns aspetos, à nossa vida normal, mas não ao normal que tínhamos antes, sobretudo enquanto não houver um controlo da doença um bocadinho mais global”.
Paulo Paixão alerta que é preciso esquecer a ideia de que as medidas de precaução vão desaparecer, pois a Covid-19 deverá “aproximar-se de um padrão semelhante ao da gripe”.
Não vamos voltar à nossa vida normal, pois aquilo que irá acontecer será uma maior aproximação a essa normalidade perdida desde o início da pandemia.
Tal como Paulo Paixão, Elisabete Ramos admite que há várias questões ainda sem resposta. Só o tempo vai dizer, por exemplo, se, quando tivermos vacinado todas as pessoas, será preciso voltar ao início do processo de vacinação – ninguém sabe, por agora, o tempo que dura a imunidade.
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