Elio Gaspari na FSP: Lula foi exemplar na relação com militares

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Na Folha de S. Paulo que oestadoacre reproduz nesta quarta-feira, 14.

Pra quem nunca ouviu falar de Elio Gaspari, ele é apenas um dos articulistas mais importantes da imprensa brasileira há décadas….É autor do livro ‘A ditadura encurralada’, entre outros.

J R Braña B.

Lula não precisa de vivandeiras

Elio Gaspari

Com oito anos de governo na biografia e tendo atravessado uma tentativa de golpe de Estado depois de sua eleição e mesmo depois da posse, Lula mostrou-se exemplar nas suas relações com os militares.

Numa trapaça da história, na volta, ele foi precedido por um ex-capitão que destruiu 30 anos de reconstrução das relações das Forças Armadas com a política. Se alguém quisesse inventar um personagem para fazer semelhante estrago precisaria de muita imaginação.

O ex-capitão encheu o governo de oficiais, botou um general da intendência no Ministério da Saúde, combateu a vacina e exaltou a cloroquina. Prenunciando apocalipses, manipulou generais para desafiar o resultado eleitoral, fingindo que duvidavam da lisura das urnas eletrônicas. Associou a imagem de oficiais do Exército a garimpos ilegais. Tamanha foi a bagunça, que em seu governo um ajudante de ordens tornou-se figura proeminente. Isso só aconteceu antes, em ponto muito menor, nos governos de João Goulart e João Batista Figueiredo.

A anarquia de Bolsonaro desembocou na armação mambembe de um golpe de mão contra o resultado eleitoral e na vandalização das sedes dos três Poderes no 8 de janeiro. Felizmente, as investigações vêm dando nome aos bois.

Por mais esforço que se faça, ninguém acredita que a maioria dos generais e coronéis votou em Lula. Felizmente, do meio civil não saíram destacadas vivandeiras. Na noite do segundo turno, o presidente da Câmara, Arthur Lira, foi o primeiro a reconhecer o resultado eleitoral.

Não tendo havido vivandeiras relevantes de um lado, a exposição dos detalhes da trama de Bolsonaro não deve estimular o surgimento de vivandeiras com sinal trocado. As investigações sobre as tramas de Bolsonaro estão sendo conduzidas pela Polícia Federal, sob o olhar do ministro Alexandre de Moraes. Dessas duas fontes têm jorrado revelações, mas não vazam maledicências. É apenas disso que se precisa.

Essa característica, associada ao comportamento de Lula, garante a preservação da unidade das Forças Armadas. Quem pisou fora das quatro linhas da Constituição deverá pagar, a partir das investigações e por decisão da Justiça. Fora daí, resta apenas o mundo das fofocas e das punhaladas pelas costas. Foi a divisão militar da segunda metade do século 20 que ajudou a produzir 1964.

A articulação golpista de Bolsonaro era de vidro e se quebrou. Além dele, foram inexpressivos os civis que rondaram quartéis. Nisso, 2022 difere, para o bem, dos cenários do século passado. Civis como Fernando Henrique Cardoso e Lula deram qualidade à relação da política com os militares. Veio um ex-capitão e quase pôs tudo a perder.

Em 1964, João Goulart acreditava estar amparado por um “dispositivo militar”. Passado mais de meio século, Jair Bolsonaro falava no “meu Exército”. Enganaram-se.

Elio Gaspari na Folha de S. Paulo

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