Do Comitê de Prevenção e Combate à Tortura do Estado do Acre
NOTA DE REPÚDIO
Diante da reportagem sobre Saúde Mental exibida no site “AC 24 horas”, publicizada no dia 01/07/2024, onde dentre várias temáticas abordadas, o editorial destaca que o Médico Psiquiatra renomado defende a internação involuntária de dependentes químicos em situação de rua e a instalação de ambulatórios psiquiátricos, fundamentando que sob o uso de substância,assim a pessoa portadora de transtorno mental não tem condições de se autodeterminar, ou seja, de saber o que é certo e errado para si.
Desta forma, o Comitê de Prevenção e Combate à Tortura do Estado do Acre e demais comitês, entidades, instituições, conselhos, movimentos sociais, defensores de direitos humanos e do SUS abaixo nominados vem mostrar indignação e repúdio à defesa da internaçãoinvoluntária de qualquer pessoa portadora de transtorno mental de forma indiscriminada e como medida primeira.
Repudiamos principalmente, a forma como o entrevistador e o editorial do AC 24 horas conduziu a formação de opinião, visando a criminalização da população em situação de rua,promovendo higienização do centro da cidade, através de internações involuntária.
A Lei no 10.216, de 6 de abril de 2001, dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental, que prevê o seguinte:Art. 2o Nos atendimentos em saúde mental, de qualquer natureza, a pessoa e seus familiares ou responsáveis serão formalmente cientificados dos direitos enumerados no parágrafo único deste artigo.
Parágrafo único. São direitos da pessoa portadora de transtorno mental:
I – ter acesso ao melhor tratamento do sistema de saúde, consentâneo às suas necessidades;
II – ser tratada com humanidade e respeito e no interesse exclusivo de beneficiar sua saúde, visando alcançar sua recuperação pela inserção na família, no trabalho e na comunidade;
III- ser protegida contra qualquer forma de abuso e exploração;
IV – ter garantia de sigilo nas informações prestadas;
V – ter direito à presença médica, em qualquer tempo, para esclarecer a necessidade ou
não de sua hospitalização involuntária;
VI – ter livre acesso aos meios de comunicação disponíveis;
VII – receber o maior número de informações a respeito de sua doença e de seu
tratamento;
VIII – ser tratada em ambiente terapêutico pelos meios menos invasivos possíveis;
IX – ser tratada, preferencialmente, em serviços comunitários de saúde mental.
Em seu art. 4o, referida Lei preceitua que a internação, em qualquer de suas modalidades só será indicada, quando os recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes.
Cabe destacar que no Estado do Acre, principalmente na capital Rio Branco, é priorizado a escolha de políticas públicas voltadas para o modelo da hospitalocêntrico, ao arrepio da Lei, sem priorizar a Rede de Atenção Psicossocial – RAPS, como por exemplo, insuficiência de Centros de Assistência Psicossocial – CAPS e a inexistência de Serviços Residenciais terapêutico para desinstitucionalizar as pessoas em sofrimento psíquico, que ainda residem no HOSMAC, bem como aquelas que estão internadas na ala psiquiátrica do presídio, apesar da determinação do Conselho Nacional de Justiça, em desinstitucionalizar as pessoas que cumprem Medida de Segurança.
Somando-se a isso, vemos que é muito preocupante o incentivo de um modelo que não se adequa a reforma psiquiátrica de 2001, ou seja, que defende a internação involuntária como forma prioritária para os cuidados das pessoas em sofrimento psíquico, decorrente do uso abusivo de álcool e outras drogas, quando deveria primar pelo cuidado comunitário com uma Rede de Atenção Psicossocial fortalecida.
Ademais, o problema das pessoas em situação de rua que fazem uso abusivo de álcool e outras drogas passa por outras esferas, como política de educação, geração de renda e outras ações governamentais integradas.
Além disso, o entrevistador desinforma a população, quando atribui ao STF a liberação da maconha, quando, na verdade, houve descriminalização do porte em quantidade inferior à 40g.
Uma vez que o portador de pequena quantidade deve deixar de ser tratado como traficante, se houver outros indícios e passa a responder administrativamente. A substância é apreendida e o usuário deve receber atenção adequada para o tratamento, devendo ser investigada a origem do produto para buscar quem realmente comercializa a substância (tráfico) e suas consequências.
Por fim, o destaque dado pelo jornal AC 24 horas, é uma maneira higienista e preconceituosa de lidar com um problema complexo, que não deve ser resolvido apenas com internação involuntária ou compulsória, como já proibido pelo Supremo Tribunal Federal, na medida cautelar na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 976 DF.
Dessa forma, repudiamos a desinformação e a defesa da institucionalização de pessoas que vêm de vários processos de abuso, o abandono dos entes federados e outros tipos de violência vivenciados por essas pessoas, que resultam em esquecidas e trancadas em instituições hospitalares.
ASSINAM:
- Evelyn Mari Pereira Santa Bárbara – Defensora Pública integrante da Coletiva
Defensoras
- Maria de Nazaré Menezes – Coordenadora Diocesana da Pastoral Carcerária de Rio
Branco – Acre
- Valéria Santana da Silva – Integrante da Associação de Redução de Danos do Acre
(AREDACRE)
- Elizângela Argemiro Maffi – Coordenadora da AREDACRE
- Amanda Reis – Águia Morena de Redução de Danos
- Leonardo Lani de Abreu – Superintendência Regional do Trabalho no Acre
- Cleide Maria de Paula Rebouças – Sesacre
- Maria Angélica Comis – Rede Brasileira de Redução de Danos e Direitos Humanos
- Raimunda Antunes Dias da Silva – ASCIFEA
- Ana Valeska Duarte – Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura
(MNPCT)
- Ângela Mata – Diretora Presidente do Centro de Estudo, Apoio aos Portadores de
LER DORT/BA (CEAPLER)
- Leonísia Moura – Projeto de Extensão “Liberdade caça jeito”: saúde mental e direito
humanos (Ufac/campus Floresta)
- Maralice dos Santos – Integrante do Movimento Nacional de População de Rua
(MNPR/RJ)
- Alberto Siqueira da Rocha Junior – UFAC/CAPAH
- Júlio Muniz – 021nossashistorias
- Márcia Aurélia dos Santos Pinho – Psicóloga inscrita no Conselho Regional de
Psicologia/Seção Acre (CRP24)
- Monica Vasconcellos Cruvinel – Coletiva Nacional de Mulheres Antimanicomiais
(CONAMAM)
- Laiza Camilo – Camilo Advocacia
- Madge Porto – LabeFem/CFCH/Ufac
- André Soares Torquato – Fórum Popular de Saúde Mental Diadema/MLB
- Cledione Jacinto de Freitas – Professor da Universidade Federal do Acre
- Álvaro Augusto de A. Mendes – Integrante da Associação Brasileira de Redução de
Danos
- João Raimundo dos Santos Silva Júnior – Psicólogo do Conselho Regional de
Psicologia da 20 Região
- Erik Amon de Andrade – Rede Escrevivências
- Larice Barbosa – Integrante da Federação dos Quilombolas e Populações
Tradicionais da Amazônia
- Cristiane Xavier de Souza – Defensora Pública do Nudedh DPRJ
- João Lucas da Silva Ramos – Integrante do Fórum de Direitos Humanos Rede Unida
- Daniel Oliveira de Souza – Aborda
- Maria Tarcísia de Medeiros – Assistente Social do Conselho Regional de Serviço
Social do Acre (CRESS/AC)
- Agleno Fernandes de Carvalho – Integrante da Comissão de Direitos Humanos do
Conselho Regional de Psicologia Acre/Rondônia- CRP
- Maria Nazaré Menezes – Comitê Estadual de Prevenção e Combate a Torturas do
Estado do Acre
- Mychel de Oliveira Silva – Integrante do Comissão de Direitos Humanos da CRP/24
- Maico Charles Lopes Pinheiro – Integrante do CRP 24/Seção Acre
- Núria Messias – Cuidar e Mover
- Paulo Amarante – Fiocruz e Abrasme
- Aluísio Campos – Integrante da Frente Ampliada em Defesa da Saúde Mental e Luta
Antimanicomial do Amazonas (FASMA)
- Patrícia da Silva – Professora do Curso de Psicologia da UFAC
- Flávia do Nascimento Oliveira – Defensora Pública do Subnúcleo de Direitos
Humanos II, da Defensoria Pública do Estado do Acre
- Adriane Corrêa da Silva – Integrante LEPEF-EDSALA/Ufac
- Leandro Menezes Simões – Upsaude
- Verinaldo de Araújo Amorim – Psicólogo do Instituto Administrativo Penitenciário
(IAPEN)
- Gina Kerly Pontes Moura – Defensora Pública do Estado do Ceará
- Roberta Gisbert de Mendonça – Defensora Pública do Estado de Alagoas
- Paula Cerqueira – IPUB/UFRJ
- Marcela Cordeiro dos Santos – Instituto Perdizes HCFMUSP
- Minéia Spoltore – Conselho Municipal de Promoção da Igualdade Racial de Rio
Branco (COMPIR/AC)
- Soleane de Souza Brasil Manchineri – Ouvidoria Geral da Defensoria Pública do
Estado do Acre
- Valéria Santana da Silva – Movimento Negro Unificado – Acre (MNU/Acre)
- Hélio Cezar Koury Filho – Departamento de Direitos Humanos/SEASDH
- Evandro Luzia Teixeira
- Samara Pinheiro dos Santos
- Guiomar Alegria Souza Silva Nobre
- Janaína Almeida Queiroz
- Stellamaris
(…)
Grifo meu: subscrevo a nota do Comitê.
J R Braña B.