Lula propõe convocar conferência para revisar Carta da ONU

“Na sua atual configuração, o Conselho de Segurança tem se mostrado incapaz de resolver conflitos, e, menos ainda, de preveni-los”, enfatizou o presidente, durante reunião ministerial do G20, em Nova York

Ricardo Stuckert

O presidente Lula voltou a defender, nesta quarta-feira (25), em Nova York, uma reforma ampla da Organização das Nações Unidas (ONU). Ele afirmou que o Brasil considera convocar uma conferência internacional para revisar a Carta da ONU como parte dos esforços de remodelar o organismo multilateral. Lula abordou o assunto durante reunião ministerial do G20, grupo atualmente presidido pelo Brasil e que reúne 19 das maiores economias do mundo mais a União Africana e a União Europeia.

O evento foi realizado às margens da Assembleia Geral das Nações Unidas, na qual, na véspera, Lula também defendeu uma reforma na Carta da ONU e, entre outros pontos, uma maior representação da África e da América Latina no Conselho de Segurança da organização internacional.

“Na sua atual configuração, o Conselho de Segurança tem se mostrado incapaz de resolver conflitos, e menos ainda de preveni-los… Com mais representatividade, em especial da África e América Latina e Caribe, teremos mais chance de superar a polarização que paralisa o órgão”, disse Lula na reunião do G20.

“Por isso, o Brasil considera apresentar proposta de convocação de uma Conferência de Revisão da Carta da ONU, com base no seu artigo 109. Cada país pode ter sua visão quanto ao modelo de reforma da governança global ideal. Mas precisamos todos concordar quanto ao fato de que a reforma é fundamental e urgente”, enfatizou.

Lula prosseguiu: “A comunidade internacional está correndo em círculos. Não conseguimos responder aos desafios globais porque trocamos o multilateralismo por ações unilaterais ou arranjos excludentes. Não trabalhamos juntos porque as instituições multilaterais estão desacreditadas”.

Lula destacou sua participação na reunião do G20 com posts na rede social Bluesky. “Hoje, participei da abertura da Reunião Ministerial do G20 na ONU, um evento histórico. Estamos comprometidos com o futuro das Nações Unidas e vamos trabalhar com dedicação em prol de um ‘Mundo Justo e de um Planeta Sustentável’, como diz o lema de nossa presidência do G20”, afirmou.

Responsabilidades

Durante o discurso na reunião do G20, Lula também deixou claro que as nações do grupo econômico não podem se furtar das responsabilidades diante das graves crises geradas pelas mudanças climáticas e cobrou ações efetivas do grupo no combate à fome e na mudança da gestão das principais instituições multilaterais.

“O Brasil está trabalhando com afinco para conseguir avanços concretos na agenda do G20. O G20 é responsável por 80% das emissões globais de gases de efeito estufa. Sua liderança na missão de conter o aquecimento a um grau e meio fará a diferença para todo o planeta”, afirmou Lula. Em 2024, o Brasil exerce a presidência do G20 e recebe a reunião de cúpula do grupo nos dias 18 e 19 de novembro, no Rio de Janeiro.

“O Brasil trouxe para o debate climático atores como bancos centrais e bancos públicos de desenvolvimento, para garantir uma transição justa. Aprovamos o primeiro documento multilateralmente acordado sobre bioeconomia”, lembrou Lula.

A Reunião de Ministros das Relações Exteriores do G20 marca um capítulo inédito na história da ONU, já que pela primeira vez os países do grupo se reuniram na sede da instituição em Nova York, em um encontro aberto a todos os integrantes da Organização.

Combate às desigualdades

Durante a fala, Lula elencou as principais pautas a serem trabalhadas pela presidência brasileira no G20, em torno dos eixos de inclusão social, mudança do clima e governança global. “No centro das nossas prioridades está a luta contra as desigualdades em todas as suas formas. Essa preocupação permeia os três eixos que guiam nossa presidência”, frisou.

“Em julho, adotamos as bases para a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, que já está aberta a adesões e será oficialmente lançada em novembro. A Aliança vai mobilizar recursos técnicos e financeiros para promover uma cesta de políticas públicas de eficácia comprovada contra esses flagelos”, explicou o presidente brasileiro.

Mudanças também na OMC

Lula também defendeu mudanças no sistema global de comércio, apontando para a paralisação da Organização Mundial do Comércio (OMC) pelo que chamou de “interesses geopolíticos e econômicos”, assim como pediu reformas em organismos multilaterais de crédito, como Banco Mundial e Fundo Monetário Internacional (FMI).

“Quando o FMI e o Banco Mundial foram criados, suas juntas executivas tinham 12 assentos para um universo de 44 países. Atualmente, são 25 assentos para mais de 190 países. Se mantida a proporção original, essas juntas deveriam ter hoje pelo menos 52 cadeiras”, disse.

“Hoje a OMC encontra-se paralisada devido a interesses geopolíticos e econômicos. Reverter o novo impulso ao protecionismo, que prejudica desproporcionalmente os países em desenvolvimento, é essencial para garantir um comércio mais equitativo. Essas mudanças terão impacto limitado sem reformas efetivas.”

Taxação dos super-ricos

O presidente lembrou ainda a insistente defesa que o Brasil tem feito, enquanto atual presidente do G20, de regras globais para a taxação dos super-ricos e apontou a medida como uma forma de combater as desigualdades e direcionar recursos para o enfrentamento das mudanças climáticas.

“A taxação de super-ricos é uma forma de combater a desigualdade e direcionar recursos a prioridades de desenvolvimento e ação climática”, afirmou.

“A ONU e seu secretário-geral devem voltar a ocupar posição central no debate sobre questões econômicas e financeiras de relevo global.”

Lula também pediu que os países do Sul Global estejam representados nos principais foros de decisão do mundo, afirmando que a comunidade internacional por estar “correndo em círculos”.

“Para romper esse ciclo vicioso, precisamos de coragem para mudar e empenho para superar as diferenças. Nossa capacidade de resposta é prejudicada, em particular, pela falta de representatividade que afeta as organizações internacionais”, avaliou.

“Se os países ricos querem o apoio do mundo em desenvolvimento para o enfrentamento das múltiplas crises do nosso tempo, o Sul Global precisa estar plenamente representado nos principais foros de decisão.”

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