Crônica de Dandão: De lateral a escritor

Por Francisco Dandão – Até um dia desses atrás (só pode mesmo ser “dia atrás”, que eu ainda, apesar de inúmeras tentativas, não aprendi a viajar na direção do futuro) eu não sabia que o jornalista premiado e escritor prolífico (o homem publica uns dez livros por ano) Pitter Lucena havia tentado ser jogador de futebol.

Eu não sabia até ler uma crônica dele falando do momento em que, num período entre a infância e a adolescência, ele deu umas pernadas como lateral-direito de uma seleção do bairro Seis de Agosto, sob a orientação de um treinador chamado Zé Américo, que também era dirigente do Andirá.

O Zé Américo era um desses caras entusiastas do futebol que vivia caçando talentos nos campinhos de periferia da capital acreana. Talentos esses que, uma vez descobertos, iriam abastecer as divisões de base do Andirá, clube carinhosamente denominado Morcego da Cadeia Velha.

O Pitter Lucena era tido e havido como um garoto promissor no mundo da bola. O Zé Américo, com o seu olho clínico, viu no Pitter, logo que este chegou em Rio Branco, oriundo de um seringal das proximidades de Xapuri, uma joia bruta a ser lapidada com o maior esmero possível.

Tão promissor era o Pitter, sujeito elegante (só não jogava de terno porque não podia pagar um alfaiate), que atuava de cabeça erguida, demonstrando raro senso de antevisão do lance, que desde o primeiro treino lhe foi dada a camisa dez, embora ele jogasse na beirada do campo.

Então eis que sobreveio a fatalidade. Jogo contra o infantil do Juventus, no estádio deste último, o Dom Giocondo Maria Grotti, Ninho da Águia. Os soberbos meninos do Juventus com chuteiras impecáveis; os guris da seleção da Seis de Agosto com os pés metidos em Kichutes ou descalços.

O jogo se desenrolando, o Juventus fazendo um gol atrás do outro. E aí, lá pelas tantas, o juiz marcou um pênalti para a seleção. O treinador Zé Américo gritou para o Pitter bater. Este vendo a chance de fazer o gol de honra do seu time fechou os olhos e deu um bicão na bola, que foi às nuvens.

Foi o momento da virada na vida do Pitter. Dizem testemunhas da época que ele ficou tão decepcionado com o próprio desempenho que tirou o Kichute ali mesmo e deu para o goleiro do seu time, que jogava de sandálias havaianas (um dos pés com um prego para segurar a correia).

E foi ali que nasceu o jornalista/escritor, cujo livro mais recente eu acabei de devorar: “A teia do golpe – Quando o Brasil esteve à beira da escuridão”. Levantamento minucioso sobre fatos recentes da história política do Brasil. Felizmente aquele pênalti não entrou. Viva Pitter e a sua literatura!

Francisco Dandão – cronista e tricolor – Dandão sabe tudo de futebol e um pouco mais…
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