É preciso não saber nada da política brasileira e de sua história para não assinar embaixo, ao menos em parte, deste texto de Luis Nassif, do GGN.
Ele se refere a Renan Calheiros, senador, e ao ex-presidente e ex-senador José Sarney, que a história e o tempo escalam como políticos importantes de sua época no Brasil.
Vamos ao texto de Nassif…
J R Braña B.
Renan Calheiros, a resistência da luta democrática
Alvo da Lava Jato, foi absolvido de acusações e é visto hoje como reserva política e peça-chave na reinstitucionalização do país
Sempre me chamou a atenção a dualidade de alguns chamados “coronéis” do Nordeste, especialmente José Sarney e Renan Calheiros.
Não saberia avaliar seu papel nos seus estados. Mas, ao longo de todo processo democrático, foram figuras centrais para garantir a estabilidade democrática, especialmente contra as ondas golpistas vindas do triângulo das Bermudas político, nas duas primeiras décadas do século – São Paulo – Rio de Janeiro – Distrito Federal, representando a estrutura de poder pré-redes sociais e pré-bolsonarismo, com grupos de mídia, o PSDB (pós-Covas) e o Poder Judiciário.
No Congresso, ambos – mais Jader Barbalho durante algum tempo – sempre foram pontos fortes da resistência democrática. E todos eles viraram personagens da mídia corporativa.
Um dos recursos mais utilizados, em períodos de macartismo, é a síndrome do Vampiro e a de Sir Galahad. Os adversários são apresentados como vampiros terríveis, com mil vidas, e que precisam ser destruídos pelas espadas mágicas da mídia. Na outra ponta, os aliados são convertidos em espadachins do Bem. Um dos mais célebres espadachins do bem, aliás, foi Demóstenes Torres, aliado do bicheiro Carlinhos Cachoeira e o mais improvável dos candidatos a Sir Galahad.
Aliás, fala-se muito na permissividade brasileira, que permitiu a invasão da economia formal pelas organizações criminosas, e o capítulo inicial foi a Revista Veja, tornando Carlinhos Cachoeira um personagem oculto, com enorme influência na República.
Na estratégia de enquadrar Sarney e Renan na categoria de “vampiros” ficava claro que os conspiradores institucionalizados sabiam bem de sua relevância para a manutenção da ordem democrática.
Por volta de 2008, quando já se articulava o golpe político-judicial contra Lula, houve uma campanha cerrada contra José Sarney, então presidente do Senado.
Sempre tive muitas ressalvas em relação a Sarney, desde sua presidência, quando fui alvo de uma campanha inclemente de seu homem forte, Ministro Saulo Ramos, que conseguiu negociar meu pescoço com o velho Otávio Frias.
Mas em 2008, Sarney representava a resistência democrática. Assumi a defesa, não do político Sarney, mas do presidente do Senado, conforme sempre salientava em minhas matérias. Ele me convidou, então, para uma conversa no Senado, onde se declarou emocionado pela defesa que eu fazia, não dele, mas do presidente do Senado. Foi uma conversa de umas duas horas, onde foi possível entender sua sobrevivência pública, uma enorme acuidade política, a visão histórica de quem passou pelo getulismo (como feroz adversário) e por Lula. Foi uma aula de história política do país, com previsões certeiras. Uma, o avanço irresistível das redes sociais e da representatividade da sociedade, reduzindo a intermediação dos políticos. Outra, o fim do PSDB de José Serra.
Renan Calheiros é outro caso típico de chefe regional, mas com enorme responsabilidade institucional em relação à República. Desde sempre, foi alvo inclemente da mídia. Veja conduziu uma de suas campanhas odiosas.
No período da Lava Jato, foi acusado de todas as formas, exposição de vida pessoal, denúncias de financiamento de campanha e uma extravagância do parcialíssimo Ministro Marco Aurélio de Mello, com uma medida cautelar visando afastá-lo da presidência do Senado, medida tão arbitrária que foi reformada pelo pleno do Supremo.
Renan virou um dos alvos preferidos da Lava Jato. O então PGR Roberto Gurgel, por exemplo, divulgou uma denúncia contra ele justamente no dia da votação da mesa do Senado, visando prejudicá-lo e beneficiar seu ex-colega procurador, o Senador Pedro Taques, um dos personagens que ascendeu beneficiado pela politização do Ministério Público Federal.
Posteriormente, Renan foi absolvido de todas as acusações. A última delas caiu no relatório de Luiz Edson Fachin, profundamente ligado à Lava Jato, mas que não encontrou provas para condená-lo.
Em 2019, Renan candidatou-se à presidência do Senado. Poderia ter sido uma das âncoras contra o vendaval bolsonarista. Foi derrotado por David Alcolumbre, graças a atuação explícita de Randolfe Rodrigues, hoje em dia um dos líderes do governo no Senado.
Na época, Randolfe seguia os ventos da Lava Jato e do clientelismo do Amapá. Grande estimulador da Lava Jato, surfou na popularidade do movimento e quase conseguiu a adesão de Chico Buarque e Caetano Veloso para sua causa. No último momento, um anjo soprou no ouvido do Chico o blefe no qual estava caindo, e ele recuou a tempo.
Agora, Renan ocupa o cargo de presidente da Comissão de Assuntos Econômicos. É peça essencial de responsabilidade política, que acabou deixado de lado pela articulação política do governo Lula. Mas mostrou sua responsabilidade articulando a contra-ofensiva que permitiu a aprovação das medidas de isenção do imposto de renda, derrotando seu arqui-inimigo Arthur Lira.
Trata-se, hoje em dia, de uma das reservas políticas na grande luta pela reinstitucionalização política do país.
(Luís Nassif, GGN)
(…)
🌎 Clique aqui e acompanhe o Acre de qualquer lugar do mundo!