Minhas raízes, a Seleção e a ditadura

histórias

Por Chagas Batista

MINHAS RAÍZES, A SELEÇÃO BRASILEIRA E A DITADURA

Em Santa Maria, em 1970, o Brasil vivia a euforia do milagre econômico e da vitória da seleção brasileira. Eu, aos 8 anos de idade, já não sentia tanta preguiça no corpo para levantar de madrugada e se embrenhar na mata junto com meu irmão para cortar seringa. Era Minha escola.

(…)preguiça(…)

Aos 8 anos de idade eu já cortava, brocava, plantava, colhia e carregava. Limpava, remava, varejava, pescava, caçava e atirava. Pastorava, distalava, arrumava, arrochava, peneirava, trepava e chiqueirava. Não tinha sossego e nem diversão, meu maior descanso e alegria era quando ia “pastorar arroz no roçado”.

Minha companhia de pastorar roçado era minha prima. A gente ficava batendo latas e caminhando por dentro do arrozal. Quando o sol esquentava e o corpo começava coçar, a gente ia mergulhar num Igarapé chamado “Escondido” para aliviar o cansaço, era o momento de glória das graúnas e dos chupões que aproveitavam pra comer o arroz.

(…)escondido(…)

Lembro que na época o rádio não parava de referenciar e exaltar a seleção brasileira tricampeã do mundo. As músicas tocavam sem parar como “cantiga de grilo”. Félix, Carlos Alberto, Brito, Piazza, Everaldo, Clodoaldo, Gérson, Rivelino, Pelé, Tostão, Jairzinho e Zagalo eram os heróis da “pátria livre”.

(….)pátria livre(…)

Aquela animação no rádio, embalava o coração dos brasileiros na floresta. A Música” Pra frente Brasil”, composta por Miguel Gustavo, era uma espécie de hino, para animar o povo na Copa do México. A ditadura militar usava a seleção e o sentimento nacionalista para esconder as atrocidades de um regime que imperava na época. ‘Noventa milhões em ação, pra frente Brasil! Salve a seleção’, transmitia patriotismo e martelava na minha cabeça.

(…)patriotismo(…)

Durante o dia na estrada, “subindo terra e descendo”, entre uma seringueira e outra, eu ia cantando as músicas da seleção. apesar de “pra frente brasil” ser a mais tocada, eu preferia uma outra do cantor repentista gaúcho Teixeirinha, que era o cantor mais popular na região junto com sua mulher e parceira Mary Terezinha. As músicas de Teixeirinha eram as mais cantadas nas festas da região junto com as de Luiz Gonzaga e Trio Nordestino.

(…)Teixeirinha(…)

A Rádio Nacional não parava de falar na cidade de Marabá,(Pará) elogiar e mandar alô para um tal major Curió. Sebastião Rodrigues de Moura, o major Curió, um dos oficiais mais conhecido do regime militar (1964-1985), que comandou a repressão à Guerrilha do Araguaia (1972-1975). Um movimento guerrilheiro existente na região amazônica brasileira, ao longo do rio Araguaia, Criada pelo Partido Comunista do Brasil (PC do B), que tinha como objetivo fomentar a luta de resistência contra a ditadura militar instalada no Brasil.

(…)Curió(….)

Enquanto a ditadura prendia , assassinava e silenciava seus crimes, a gente em Santa Maria, continuava com o pé na estrada cortando seringa para pagar a dívida ao barracão e tirar um pouco de saldo, era o que interessava.

Chagas Batista, de Tarauacá

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