Por Chagas Batista
A vida do trabalhador rural nativo que migra para cidade tem forte impacto social, cultural e econômico. Especialmente no tempo que reinava a opressão dos barracões e a ausência do Estado. Eu e minha família sentimos isso quando tivemos que fazer essa mudança.
(…Mudança…)
Na esperança de uma vida melhor, com sistema de saúde e de ensino público – e fugindo do sofrimento, viemos morar na cidade. Essas perspectivas foram frustradas pela dura realidade que encontramos. A nossa casa era muito apertada, não oferecia condições mínimas de conforto e privacidade. Os poucos Cruzeiros (dinheiro) que restaram, rapidamente foram acabando, ninguém da família tinha emprego.
(…Cruzeiros…)
A gente não conseguia entender o impacto da mudança. Em Santa Maria, apesar de não ter escola, assistência de saúde, da exploração do barracão, do castigo do impaludismo, (malária) diarréia e outras doenças, todos os dias tinhamos um quebra – jejum, um almoço e pelo menos um caldo de piaba e “caíco” para jantar sem precisar de dinheiro. Na cidade até para comer uma banana era preciso ter moeda do bolso.
(…sem dinheiro no bolso…)
Já faltava dinheiro para comprar material escolar, roupa e calçado para começar estudar. Todos da família precisavam se virar. Meu pai foi capinar rua e meu irmão velho carregar carga, minha mãe era costureira e começou arrumar uma freguesia. Minhas irmãs foram ser domésticas, eu comecei a vender tapioca, açaí, picolé e depois bater tijolos. O outro meu irmão teve que voltar para o seringal para cortar seringa e ajudar no nosso sustento.
(…precisavam se virar…)
Os primeiros dias na escola foram difíceis. Eu não tinha ninguém conhecido na escola. Sabendo que era discriminado por ter chegado do seringal, me sentia completamente fora do meu mundo. Sofria discriminação e era apelidado de ‘Faca torta’, se referia à função de seringueiro. Para essas pessoas preconceituosas, seringueiro era considerado uma profissão de ultima classe. Inibido e acanhado, eu sempre ficava sentado na ultima cadeira. mesmo assim, não faltava um aluno metido à bacana para me insultar e querer humilhar. Quando a aula terminava sempre rolava uma confusão.
(…bulling na escola…)
Não foi fácil se adaptar a uma realidade completamente diferente. O poder político na cidade não era diferente do poder dos coronéis dos seringais e, além disso, o Brasil vivia sob o “comando” de uma ditadura. Fincar raízes em outra terra era um grande desafio
Chagas Batista, de Tarauacá