Por Chagas Batista
No início da década de 70 quando chegamos em Tarauacá, um assunto dominava a cidade. A presença do Exército Brasileiro na abertura da estrada de Tarauacá para Cruzeiro do Sul. Eu não ouvia falar o nome do prefeito, nem do Juiz da cidade, mas ouvia com frequência o nome do coronel chefe do 7º batalhão, que comandava as tropas no município.
(…coronel…)
Ouvia falar muito também sobre a valentia dos recrutas. Jovens que todos os anos eram chamados para “servir a pátria amada”. Comentava-se, que os recrutas formavam arruaças, acabavam as festas, enfrentavam policiais e namoravam com as moças que desejavam. Muitos pais não deixavam suas filhas sair à rua com medo de serem agredidas. Até os “barões da borracha temiam”.
(…acabavam festas…) – Em Sena tentaram isso uma vez…no Arraial do Padre Paolino…se deram mal – J R Braña B.
O temor era maior quando ouvia-se comentários que o Capitão chefe dos jovens militares, do auto de sua arrogância avisava: “Quem tiver suas Poldas que prendam, porque meus cavalos estão soltos”. Ou seja, a palavra do comandante militar deixava explícito que, se seus soldados estuprasse um moça o crime era do pai que não prendia sua filha.
(…meus cavalos soltos…) – essa frase/ameaça ridícula foi disseminada no interior do Acre – J R Braña B.
Na Escola Plácido de Castro onde comecei a estudar, todos os dias, antes de começar a aula, éramos obrigados cumprir a ordem unida. A gente entrava numa fila e marchava até entrar na sala. Na hora do recreio era o mesmo ritual, tudo era feito em forma de obediência ao regime militar.
(…ordem unida…) – que coisa mais sentido…ainda mais numa escoala – J R Braña B.
Na época, quando aproximava-se do dia 7 de setembro, dia da Independência ou aniversário da cidade, os militares iam para dentro das escolas ensinar os estudantes a marchar. Os saldados agiam com truculência contra o aluno que não cumprisse tudo como eles ordenavam. Um dia vi um sargento usar o coice da metralhadora para forçar um aluno que tinha as pernas cambotas, o militar queria que o estudante das pernas tortas ficasse em posição “sentido”, com as pernas bem coladinhas do joelho ao calcanhar.
(…truculência…)
Um dia os militares exageram na dose, pegaram um aluno que teimava em não cumprir as suas ordens, o arrastaram da fila, chutaram, rasgaram a roupa do estudante rebelde e levaram para o quartel. A reação foi imediata. Os alunos deixaram a marcha e se dirigiram rumo ao quartel para repudiar a truculência. A reação da repressão foi mais rápida. Um tenente pulou no meio da rua e gritou: “corram para dentro da escola senão prendo todos vocês”.
(….reação…)
Todos correram em disparada para dentro da sala – e eu fiquei sozinho teimando a olhar para o Tenente. O oficial aproximou-se e me indagou: Você é doido? Respondi que não, disse a ele que estava ali porque um estudante havia apanhado sem merecer. O militar ficou me olhando e começou conversar até me convencer a voltar para a sala de aula e deixar o colega preso. Dias depois, encontrei o tenente na rua, ele me reconheceu e convidou-me para jogar bola na quadra da escola.
(…você é doido?…)
Acredito que esse episódio me despertou consciência e rebeldia contra as Tronqueiras, que impedem o curso livre das águas e do barco no Rio.
Chagas Batista, de Tarauacá