Apoiado por Elon Musk, AfD distribui ‘bilhetes de deportação’ como propaganda
Andrea Dip*, ICL – O Alternative für Deutschland (AfD), partido de extrema direita alemão investigado pela inteligência do país por seus discursos de ódio e conexões com grupos neonazistas, ficou mais conhecido do público não germânico nos últimos dias.
Isso porque o dono do X, CEO da Tesla e líder do “Departamento de Eficiência Governamental” de Donald Trump, Elon Musk, tem feito campanha aberta e reiterada pela eleição da candidata Alice Weidel para chanceler da Alemanha nas eleições que acontecem no dia 23 de fevereiro.
Musk transmitiu também a conferência do partido, que aconteceu nesse fim de semana em que Weidel teve sua candidatura confirmada e fez um discurso inflamado sobre fechar fronteiras, deportar em massa e cortar auxílios a asilados. O evento sofreu atrasos por conta de fortes protestos da população local.
Musk também transmitiu no seu perfil no X uma entrevista com a candidata e tem dado entrevistas a jornais alemães endossando seu posicionamento e declarando coisas como “somente o AfD pode salvar a Alemanha, ponto final, e as pessoas realmente precisam apoiar o AfD, caso contrário, as coisas ficarão muito, muito piores na Alemanha”.
Talvez revigorado ou encorajado pelo apoio, o partido extremista causou mais um escândalo neste fim de semana ao enviar pelo correio panfletos que imitam passagens aéreas só de ida, “De: Alemanha — Para: País de origem”. Na parte do passageiro se lê “Imigrantes ilegais”. A data de partida é o dia das eleições federais, 23 de fevereiro. Na parte de baixo está escrito “Apenas a remigração pode salvar a Alemanha”.

O nome do passageiro já vem pré-impresso como “Imigrante Ilegal”. Também estão impressos os dizeres “Só a remigração pode salvar a Alemanha” e “É bom em casa também”.
A imprensa local noticiou que o “bilhete de deportação” foi encontrado por pessoas com histórico de imigração em suas caixas de correio, na área de Karlsruhe. Um código QR impresso no bilhete leva ao site do AfD Karlsruhe, onde está disponível para download.
A polícia criminal de Karlsruhe iniciou investigações por suspeita de incitamento ao ódio. Num comunicado datado de 13 de janeiro, a associação distrital da AfD disse que as exigências são “completamente legítimas”, “de acordo com a lei” e referem-se apenas a pessoas que se encontram ilegalmente na Alemanha.
Mas para além do horror com o “bilhete de deportação” em si e das questões sobre a possibilidade real do partido fascista governar ou não, já que os outros partidos têm se negado a fazer coalizões, essa ousada aproximação de Musk com o AfD é um caso simbólico, que deve ser observado em médio e longo prazo.
Porque até hoje, mesmo os partidos e organizações de direita alemães e europeus em geral têm um certo receio de se aproximar publicamente da sigla extremista. Não há representantes da AfD em congressos transnacionais, por exemplo. Há de se observar se isso vai mudar com o apoio do aliado de Trump.
Caso mude, será um forte indicativo do poder e da influência política desse novo momento das big techs, não apenas para a Alemanha, mas para o mundo todo.
*Andrea Dip – Jornalista investigativa e estudante de psicanálise. Autora do livro-reportagem “Em nome de quem? A bancada evangélica e seu projeto de poder”. É pesquisadora na Freie Universität de Berlim e apresenta o podcast Pauta Pública na Agência Pública de Jornalismo Investigativo.