Quando a história pode estar se repetindo.
J R Braña B.
Paulo Nogueira
DCM
O DESESPERO DE EMÍLIO ODEBRECHT
Disse já mais de uma vez que tenho sido procurado por jornalistas da Globo revoltados com o que a empresa tem feito.
Uma mensagem que me chegou ontem à noite me trouxe tristes memórias.
Não tenho condições de confirmar. Então vou desde já avisando que o teor da carta pode ser falso.
Mas, lamentavelmente, é uma situação factível.
X – chamemos assim –me disse o seguinte. “Emílio Odebrecht procurou João Roberto Marinho em busca de ajuda para seu filho Marcelo, preso. E ouviu o seguinte: ‘Fala para o Marcelo entregar o Lula que a gente ajuda.’”
De novo: pode ser invenção, e espero que seja. Não consigo acreditar que João Roberto Marinho fosse capaz de uma resposta daquelas. Convivi com JRM no Conselho Editorial da Globo quase três anos, entre 2006 e 2008, e guardei a lembrança de um homem equilibrado, sereno e sensato.
Mas o mais importante é outra coisa.
Neste momento, já não é surpresa se um pai desesperado recorrer à Globo na procura de ajuda para um filho preso.
Se há alguém que pode efetivamente colaborar num quadro daqueles é a Globo, de cujo apoio Moro depende. Moro sabe que se a Globo se voltar contra ele por algum motivo, ele pode terminar na cadeia pelos abusos cometidos na Lava Jato.
A mensagem de X me remeteu à ditadura militar.
Pais de filhos desaparecidos tentavam de tudo para conseguir informações. Os donos de empresas jornalísticas, dada a sua proximidade com os generais, eram frequentemente procurados.
O livro K, de Bernardo Kucinski, conta uma dessas histórias. É um livro autobiográfico. K é o pai de Kucinski. E o enredo gira em torno da enlouquecedora jornada de K para conseguir informações sobre sua filha, Ana Rosa, sequestrada (e morta) pela ditadura. Ana, irmã de Bernardo Kucinski, era uma jovem e brilhante professora de química da USP.
K recorreu a um empresário de mídia não nomeado no livro, e judeu como ele. Mas nada obteve senão uma seca resposta de que não havia como fazer nada, visto que ela era comunista.
A filha de K já estava morta enquanto ele ainda a procurava. Abutres chegavam a ele dizendo que tinham informações, e as dariam caso recebessem dinheiro.
O que K faria hoje caso um filho fosse alcançado por Moro?
Se tivesse acesso à Globo, como provavelmente Emílio Odebrecht tem, recorreria aos Marinhos.
É a história, perturbadoramente, que se remete.
Troque os generais por Moro. Foi dado a Moro um poder extraordinário de prender pessoas. Ninguém o fiscaliza, ninguém lhe cobra nada. O antigo ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, sempre se omitiu diante das evidências de abuso e partidarismo de Moro.
Os juízes do STF, como notou com precisão Lula, se acovardaram. A imprensa, interessada no foco anti-PT dado por Moro, sempre o incentivou. Os primeiros e tímidos reparos apareceram apenas quando extrapolou como no caso da condução coercitiva de Lula.
É apavorante a perspectiva de que retornemos ao ambiente da ditadura. Emílio Odebrecht, quer tenha ou não apelado para João Roberto Marinho, é um pai tão atormentado quanto K.
E isto pode ser uma tragédia nacional.