Francisco Dandão – No tempo em que eu era estudante de Letras, na Universidade Federal do Acre (Ufac), em mil novecentos e lá vai pedrinhas, aprendi que as palavras são vivas. E, assim sendo, ao longo do tempo inclemente elas podem migrar de um sentido a outro, se moldando às gírias que vão surgindo.
Antigamente, por exemplo, em se tratando de futebol, o vocábulo “zona”, seguido da palavra “agrião”, “zona do agrião”, se aplicava à grande área de cada time. Assim, quando o técnico queria mandar um jogador cruzar para a área inimiga, ele dizia para o sujeito jogar a bola na “zona do agrião”.
No mundo líquido pós-moderno, porém, onde nenhuma forma permanece igual por minuto algum, mais ou menos como Heráclito descobriu ser o rio em que os seus contemporâneos se banhavam, não existe mais “zona do agrião”. Zona agora só a do terror, do medo, ou da confusão.
Indesejada, os times fogem da zona como o diabo foge da cruz (ou o vampiro foge da luz do sol). Quem está na zona, quer sair o mais rápido possível; quem está fora dela, move céus e terras para não entrar. Mas o certo é que, dadas as diversas circunstâncias, alguém vai ter que estar por lá.
No momento em que escrevo, meio da manhã de um sábado (29 de junho), com um sol ardente se derramando pelas cabeças dos transeuntes de Copacabana, olhando pela janela para os braços abertos do Cristo Redentor, três gigantes do futebol brasileiro se encontram nessa incômoda situação.
Corinthians, Grêmio e Fluminense, clubes da maior tradição, detentores de glórias mil, ocupam, respectivamente, o 18º, 19º e 20º lugar num campeonato em que os quatro últimos serão rebaixados ao fim de 38 rodadas. Uma classificação incompatível para a grandeza de cada um deles.
O caso do Fluminense, meu querido Tricolor das Laranjeiras, é o mais enigmático. Afinal, poucos meses atrás o time se sagrou campeão da América, derrotando o tradicionalíssimo argentino Boca Juniors. Momento de êxtase que em nada indicava a draga que sucederia o expressivo título.
O que teria mudado de lá pra cá? O que estaria travando as pernas dos craques do tricolor? Desaprender a jogar bola, eu garanto que não foi. Falta de vontade de vencer, eu garanto que não é. Questões de bastidores, tumultuando o ambiente, eu acho pouco provável. Então o que poderia ser?
Sinceramente, eu não sei. Provavelmente, nunca saberei. O que sei é que existem por aí várias teorias tentando decifrar o mistério, desde o envelhecimento do elenco até à teimosia do técnico recém demitido. Tudo especulação. Enquanto isso a esfinge segue devorando as minhas esperanças.
Francisco Dandão – cronista e tricolor – sabe tudo de futebol e um pouco mais…