Fim de domingo…
Relembramos entrevista exclusiva realizada em fevereiro de 2004 com Carlos Abrantes, ex-secretário da Fazenda do governo Flaviano Melo.
Conversa, feita em Porto, Portugal, Abrantes compartilha suas experiências como ‘exilado’ e as dores de um escândalo político.
[Memória]
Autor: J R Braña B
Relembre o que ele disse nessa entrevista única e exclusiva feita em Portugal sobre sua vida de ‘exilado’ e o escândalo do governo que ele foi secretário de fazenda
O exílio
Quando saí do Acre rumo à Europa não tinha certeza se, nos dias em que ficaria em Portugal, conseguiria entrevistar o ex-secretário de fazenda do Acre, Carlos Abrantes. Daqui do Acre eu não consegui falar ao telefone com ele. Caía sempre numa mensagem eletrônica que não me dava alternativa alguma.
Em Lisboa, do hotel, fiz a primeira tentativa ligando para a sua casa, em Guimarães, região metropolitana da segunda cidade daquele país, Porto. Eram 8h da manhã do dia 5 de fevereiro (2h da madrugada em Rio Branco)
-Alô? Seu Abrantes, aqui é o Braña. Estou em Lisboa e gostaria de falar com o senhor. É possível?
-Sim.
-Pode ser amanhã?
-Não. Amanhã tenho uma consulta e não posso. Depois de amanhã eu posso.
-Como eu faço para chegar até aí?
-Você vai à estação e pega o trem Alfa. E desce na estação Porto/Campanhã.
Assim eu fiz no dia marcado. Tomei o trem Alfa no horário das 7h55min. Nesse dia fiz a cozinha do hotel fazer o meu café antes das 6 da matina (1 da madrugada em Rio Branco). Por quê? Tudo é muito caro e se você se alimenta bem no Pequeno Almoço (o nosso café da manhã) você faz uma boa economia de Euros durante o dia com lanches e afins. Afinal de contas, os custos da minha viagem foram e estão sendo pagos com esforço próprio e de minha família.
Peguei o TGV (Trem de Alta Velocidade) na hora exata. Preço da passagem: E$ 20 (quase 80 reais). É dispensável falar das condições e conforto do trem. Coisas da Europa. Destino: a cidade do Porto. No Norte. Distancia: 350 km. Tempo de viagem: 3h11min, incluindo as paradas em cidades como Espinho, Coimbra, Aveiro e outras…
Acomodado na poltrona, comecei anotar o roteiro da conversa que tentaria ensejar com o ex-secretário de fazendo do Acre. Dividi o tempo de viagem fazendo anotações, vendo a paisagem, às vezes paralelo ao Oceano Atlântico e, para minha surpresa, ouvindo duas senhoras falando nas poltronas atrás de mim sobre os imigrantes das ex-colônias que vão para Portugal e querem ficar no país de qualquer jeito.
-Não dá. Portugal não suporta tantos imigrantes. Portugal já fez muito pelo Brasil, por Angola etc etc…
Só não entrei na conversa porque não tinha o menor sentido. Mas que deu vontade, isso deu. De vez em quando o Brasil voltava na conversa das duas mulheres que falavam de parentes que vieram para cá e se acostumaram com os costumes locais.
-É. Eles têm lá os seus costumes e nós os nossos – chegaram elas a essa conclusão.
O carrinho de lanche do serviço de bordo do trem – que não está incluído no preço da passagem – parou no corredor, bem ao meu lado.
-Não. Obrigado – dispensei (lembra do Pequeno Almoço?)
Várias páginas do meu caderno já estavam repletas de anotações com perguntas para o senhor Abrantes. Algumas absurdas, admito. Mas o quê fazer? A personagem que ia encontrar tem uma história no Acre e não podia perder a oportunidade.
Porto começa aparecer pela janela do trem. Em instantes uma estação e um nome que ficaram a noite toda na minha cabeça: Campanhã.
-Será que vai dar certo? Será que o seu Abrantes vai mesmo encontrar comigo? – Tudo passava pela minha mente.
Afinal de contas, quando era bancário e do Sindicato, batemos muito no governo que ele defendeu e fez parte.
O trem parou. Desci. Não sei por que, mas saí com as duas máquinas fotográficas ligadas (uma digital e a outra normal) preparadas para clicar.
E se Abrantes me visse e não quisesse mais falar comigo? Estava preparado para qualquer situação. Tinha que estar.
O avistei antes do que ele a mim. Nos encontramos. Ele estava alegre, percebi.
-Olá, Braña! Fez uma boa viagem?
-Ótima, seu Abrantes.
Impressão pessoal. Mesmo com 70 anos e vítima de aneurisma abdominal (informação dele) o achei bem fisicamente. Com aparência saudável. Mais novo do que imaginei. Claro, o tempo faz as suas marcas e ele as tem.
Entramos num táxi e fomos ao centro da cidade do Porto. Uma cidade fantástica que, infelizmente, não deu para aproveitar por, pelo menos, uns dois dias. No dia seguinte eu seguiria para Espanha e não dava para adiar.
Caminhamos pelas ruas. De vez em quando tínhamos que parar. Faltava-lhe ar. Abrantes ficava ofegante e não aguentava o meu ritmo. Depois se recompunha e continuávamos.
Almoçamos peixe num restaurante médio para os padrões portugueses. Depois entramos em monumentos do centro, vimos arte em azulejos e outras. Abrantes me mostrou o principal Teatro do Porto. A igreja Universal, essa do Brasil, tentou comprar o local. Os artistas da cidade se reuniram, se acorrentaram ao prédio e o negócio foi desfeito. Para o bem da cultura.
Depois de uma hora e meia de entretantos, eu e Abrantes chegamos aos finalmentes.
-Você pergunta e eu respondo – disse ele.
Eu quero conversar sobre tudo. Sobre as coisas ruins e sobre as coisas boas – respondi.
Explicação pessoal. Não fui a esse encontro com gosto de sangue na boca. Fui fazer um trabalho jornalístico que imagino irá servir para alguma coisa na imprensa do Acre. Mesmo compreendendo todos os problemas que envolvem o entrevistado, não me comportei como um juiz. Não sou a justiça. Quem julga é a justiça, que já o julgou e o sentenciou.
Nessa primeira parte da entrevista (a segunda foi publicada na edição seguinte do jornal O Estado e que você pode ler abaixo) Abrantes fala , com tristeza, da sua saída forçada do Acre. Do seu exílio e da falta que diz sentir das pessoas e das coisas que deixou aqui para refugiar-se na longínqua Guimarães. Quando faço uma pergunta sobre um assunto que todos conhecem no Acre, Abrantes chora…
Jornal O Estado (OE) – Há quanto tempo o senhor deixou o Acre?
Carlos Abrantes (CA) – Eu saí em 1992.
OE – 12 anos.
CA – 12 anos de exílio.
OE – O senhor considera isso um exílio?
CA – Absolutamente. É um exílio.
OE – Como é que o senhor findou indo para o Brasil…O senhor pode contar essa história?
CA – Fui para o Brasil com 17 anos. Desembarquei na praça Mauá (Rio) sem conhecer uma pessoa sequer. E fui trilhando meus caminhos e com esforço, como sempre fiz, consegui triunfar e cheguei ao Acre na condição de um representante de laboratório farmacêutico.
OE – Em que ano se deu isso?
CA – Em 1954. No dia 6 de agosto de 1954.
OE – Como representante de laboratório e…?
CA – Foi amor à primeira vista. Em dezembro eu tinha direito a férias e optei por passar em Rio Branco. Em 1958 fixei residência definitiva no Acre. De 54 a 58 eu ia ao Acre, em todos os municípios…eram sete na ocasião.
OE – Vender remédios…
CA – Exatamente…Como propagandista junto aos médicos e farmácias.
OE – O senhor pode explicar como uma pessoa nascida num país que tem toda uma história, um clima diferente, uma vida intelectual também diferente etc etc.. se apaixonar e ir morar num lugar quente, úmido, no meio da floresta, tão distante como o Acre? Ainda mais naquele tempo em que o desenvolvimento era uma coisa impensável?
CA – É porque eu também nasci numa cidade pequena e onde todos se conheciam. E em Rio Branco foi exatamente o ambiente que encontrei. Quando cheguei a cidade era pequena. Terminava na Maternidade. Da Maternidade para lá não havia mais nada. Todos nos conhecíamos. Havia uma solidariedade muito grande entre as pessoas. Se morria alguém o comércio todo fechava. E a cidade me atraiu de tal maneira que, quatro anos depois, me fixei em termos definitivos. E por lá fiquei e de lá nunca quis sair. E se lá não estou é porque não posso.
OE – Que lição o senhor tira desse período em que viveu no Acre?
CA – É um período relativamente longo, não é? Quando eu cheguei o Acre era território federal. Depois daquela empolgante luta, digamos assim, dos acreanos para que de território passasse a estado.
OE – O senhor acompanhou esse período da vida política do Acre?
CA – Acompanhei e aderi. Embora tivesse simpatia por um partido, que a priori, era contra a transformação do território em estado, eu, contrariando, digamos assim, a tendência quase que oficial do meu partido eu sempre fui adepto de que o Acre deveria – e não apenas deveria, mas merecia – transformar-se em um estado como de fato , felizmente para todos nós, aconteceu.
OE – O senhor chegou ao Acre como um homem de esquerda?
CA – Acho que essa classificação, de esquerda e direita, é de caráter muito subjetivo.
OE – Por que?
CA – Eu, às vezes, faço até uma comparação. Você pega uma baleia e um rato. Ambos são mamíferos. Mas a diferença entre um rato e uma baleia é abissal. Entre um morcego e um elefante, que também são mamíferos, é imensa a diferença entre um e outro. Então, quando se fala em esquerda ou quando se fala em direita é muito difícil de definir exatamente o que são. Diria que sou uma pessoa que sempre fui. E continua a ser. Um progressista. Sempre achei que a humanidade não para. A direita, ou que, arbitrariamente acho, se chama de direita, pretende a estabilização do mundo do jeito que ele está. Que o status quo não se altere. E eu penso exatamente o inverso. Que o mundo tem de caminhar rumo à utopia. Por mais lento, por mais difícil, por mais pedregoso que seja esse caminho.
OE – Qual é a utopia do mundo atual, senhor Abrantes?
CA – Vivemos hoje sem utopia. A utopia parece que está sepultada e é preciso ressuscitá-la. Hoje é o neoliberalismo, a globalização….são ficções, mitos que, parecem, como epidemias, tomaram conta do planeta e que têm significado um retrocesso no sentido da evolução rumo à utopia.
OE – Como o senhor avalia essa transformação de 15 países da Europa com a adoção do Euro?
CA – Eu acho altamente positivo. Em todos os níveis. Há ajustes a serem feitos. Muitos já fizeram. Há determinado preço a pagar por isso. Os estados que aderiram ao Euro perderam um pouco da sua autonomia no que se refere ao controle das suas finanças públicas, mas há infinitas vantagens. E essas vantagens estão à vista de todos. A moeda, digamos, que se constituía na moeda universal, o dólar, hoje já tem outra moeda para competir, que é o Euro. A ponto de o euro valer mais que o dólar. Então eu acho que competição é saudável, não apenas para os países que aderiram ao euro, mas para a comunidade internacional como um todo.
OE – Qual é a sua rotina aqui na cidade do Porto?
CA – Eu vivo na cidade de Guimarães, que é, digamos, onde nasceu Portugal.
OE – Faz parte da grande Porto…
CA – Exatamente. É uma cidade pequena, com 50 mil habitantes. E eu diria que do meu tempo disponível 70% reservo à leitura e um pouco à internet. Em termos de lazer praticamente é isso. Tenho lido nesses últimos 10 anos, talvez, o que não tenha lido nos 50 anos anteriores.
OE – O que senhor lê?
CA – Sobre todos os assuntos. Preferencialmente, sobre história. E mais preferencialmente entre as vinculações na história entre Portugal e o Brasil e entre o Brasil e Portugal.
OE – O Acre tem espaço nesse tipo de investigação histórica?
CA – Tem tanto espaço! Eu, inclusive, tinha um projeto de, junto à Torre do Tombo, aqui, investigar se a famosa comunicação que o Estado Independente do Acre, o Galvez, fez aos estados europeus da criação desse estado independente e se essa credencial foi entregue aqui. Mas o projeto está arquivado. Sine die, né? Que seria, talvez, relevante, interessante. Curioso, pelo menos, para a história do Acre saber se esse enviado do Galvez, realmente, chegou a entregar essa credencial que comunicava a criação do Estado Independente do Acre.
OE – Deixou de lado mesmo esse projeto? De escrever sobre isso?
CA – Eu nunca deixei de lado nada que diga respeito ao Acre. Acontece que, às vezes, as coisas ficam dormentes durante um certo tempo, né? Mas, de repente, eu volto à tona. É um projeto que está arquivado, mas não em termos definitivos.
OE – Na última vez que conversamos, o senhor me disse que estava com problemas de saúde..Como está a sua saúde?
CA – Não está boa. Eu, por exemplo, vou ser operado na próxima quarta-feira. A dúvida é saber onde vou ser operado. Se em Guimarães, no Porto ou em Coimbra.
OE – O senhor pode dizer qual é a doença?
CA – Eu tenho aneurisma abdominal…é uma coisa séria. Até que essa operação ocorra, se eu sobreviver…
OE – Vai sobreviver, sim…
CA – Aí vou fazer novos projetos, reciclar minha vida. Grande parte da minha saúde foi abalada por uma série de acontecimentos,
OE – Qual é a sua idade?
CA – Estou com 70 anos.
OE – Bem vividos?
CA – Bem vividos, embora nos últimos 10 anos tenham sido pessimamente vividos.
OE – O senhor recebe sempre visitas de acreanos aqui?
CA – Já recebi. Tive o prazer de ter em minha casa, por 21 dias, uma das pessoas que eu mais prezo, que é o professor Geraldo Mesquita (ex-gov do Acre já falecido). Foram os 20 dias mais alegres que eu passei nos últimos 10 anos.
OE – O que vocês fizeram juntos?
CA – Fizemos tudo. O Mesquita é um intelectual. Um homem apaixonado pela história. Nós líamos os Lusíadas, nós íamos visitar os lugares históricos..Conversávamos 99% dos assuntos sobre o Acre. O Acre atual e o antigo, que era dele e meu. Era, fundamentalmente, o que fazíamos. Às vezes, passávamos o dia inteiro em casa discutindo coisas do Acre. Divergindo muitas vezes. Concordando outras tantas.
OE – O senhor está sempre atualizado com as notícias que acontecem no Acre? O senhor lê O Estado?
CA – Vejo pelos jornais e, com destaque, pelo jornal O Estado. Porque, como é que se diz, vocês dão notícias on-line e eu vou acompanhando muitas das coisas do Acre pelo O Estado na internet.
OE – O senhor tem dito que gosta do nosso jornal. Por quê?
CA – Gosto. Não é porque estou falando com você, até porque se não gostasse eu diria. Vocês são ponderados, equilibrados, fazem um jornalismo sério. Sem subserviências condenáveis. Que tem, digamos, a sua linha, sua concepção, seus valores, que são normais, mas acima de tudo eu os acho sério. E isso me parece mais importante.
OE – O senhor topa escrever para O Estado, mesmo do ‘exílio’, e contar as coisas que sabe e conhece do Acre?
CA – Eu fico com receio de fazê-lo, viu, Braña?
OE – Por que?
CA – Porque, digamos, as pessoas que me conhecem, que privaram comigo durante quase 40 anos poderiam até valorizar o que eu eventualmente escreveria, aceitando ou não, concordando ou não, mas as novas gerações não têm a menor ideia de quem é esse tal de Abrantes. Quando eu apareço nos jornais do Acre é de forma negativa.
OE – Nós conversávamos antes de começar a gravar e o senhor demonstra, quando o assunto é o governo Flaviano Melo, que o senhor foi secretário, uma série de reações tipo ressentimentos, tristeza, revolta etc etc…Eu pergunto: como o senhor tem vivido esses anos todos quando o assunto Flávio-Nogueira, a conta-fantasma que roubava dinheiro da população atrasando o pagamento do funcionalismo, volta e meia entra no seu pensamento?
CA – De todos esses sentimentos que você se referiu eu cito um que ficou de forma mais bem acentuada: que é o sentimento de saudade (neste momento Abrantes começa a chorar. Acende um cigarro. Estamos sentados em cadeiras da estação Campanhã, na cidade do Porto. Passavam das 13h (8 da manhã no Acre)
Fim da primeira parte.
Início da segunda parte.
Carlos Abrantes, 2ª parte da entrevista (Só volto ilibado ao Acre)
2ª parte –
Arquivo – Carlos Abrantes, ex-secretário de fazenda do governo Flaviano Melo – entrevista – oestado – fevereiro 2004 – Porto – Portugal
[Memória]
Autor: J R Braña B.
Abrantes: ‘Só volto ilibado’
Durante todo o tempo em que conversei com o ex-secretário Carlos Abrantes, na cidade do Porto, Portugal, em nenhum momento ele pronunciou o nome ‘Flaviano Melo’. Por quê? Ele se recusa a chamá-lo assim. Para ele, o político do PMDB local não merece o sobrenome ‘Melo’. Isso põe ‘nódoa’, segundo Abrantes, na história e na tradição do pai do ex-governador (hoje dep federal) Raimundo Melo, já falecido, cujo pecado grave no Acre, filosofa Abrantes, foi transformar a política acreana em ‘organizações familiares’.
Abrantes se refere ao seu ex-chefe, sempre, como ‘dr Flaviano Batista’.
Com o gravador desligado, Abrantes contou-me episódios que aconteceram no Acre do seu tempo. Fez referências ruins a políticos conhecidos e até insinuações contra dois ex-governadores, Edmundo Pinto e Jorge Kalume, e tirou sarro do jornalista Tião Maia, um recordista de matérias na imprensa local com denúncias contra o ex-secretário.
O primeiro (Edmundo), de ser o responsável por seu envolvimento na ‘Flávio-Nogueira. ‘Vingança por negativas na época da campanha’. Abrantes era secretário de fazenda e Edmundo candidato a governador.
(Abrantes afirmou que Emilio Assmar – que morreu vítima de câncer – confessou a ele de que Edmundo teria decidido envolvê-lo no escândalo em represália. Durante a conversa, Abrantes revelou os nomes que estavam na mesma mesa da reunião, mas pediu para este repórter não decliná-los)
O segundo (Kalume), perseguição política. Abrantes conta que o período em que Kalume mandava no Acre foi obrigado a deixar o estado. E disse que foi avisado numa noite, depois que a Eletroacre apagava a luz na capital, por Félix Bestene, irmão do atual deputado estadual José Bestene.
-Quando a luz apagou, Bestene foi à minha casa e me avisou que uma reunião de governo havia decidido que eu seria expulso ou preso. Bestene me pediu para sumir. E eu sumi com os meus filhos pequenos para o Rio de Janeiro. Foi feita uma operação por meus amigos para que eu deixasse o Acre sã e salvo.
(Abrantes cita o nome de personalidades que ainda hoje estão no nosso meio e que participaram dessa reunião da Ditadura que decidiu expulsá-lo do Acre e que os omito aqui porque ele pediu para não decliná-los publicamente).
O terceiro (Tião Maia, que escreveu em O Estado), Abrantes me indagou sobre o suposto ódio que Tião nutre por ele. Eu disse que desconhecia esse ‘ódio’, mas Abrantes não conformou-se e deu sua própria resposta.
-Deve ser problema de infância – arriscou o ex-secretário, tentando entender a natureza do bravo e inquieto repórter acreano.
Não tive como não rir.
Sobre o escândalo da Flávio-Nogueira, Abrantes pronunciou algumas frases que a mim pareceram interessantes e eu as reproduzo:
1 – O governador dr Flaviano Batista nunca tratou comigo sobre esse assunto, embora eu tivesse, por várias vezes, tentado saber com ele sobre essa conta que eu ouvia falar.
2 – Quando fui assumir a fazenda, o dr Flaviano Batista me disse: quero uma pessoa de integridade na fazenda porque eu preciso tirar o Deusdeth Nogueira, então titular da pasta. Vou arranjar um curso de oficial da PM pra ele no Rio Grande do Sul e tirá-lo do Acre.
3 – Deusdeth foi inocente em assinar documentos levados por Amir – gerente – que isentavam o Banco do Brasil da responsabilidade pelo atraso no pagamento do funcionalismo.
4 – Uma vez encontrei no Palácio com o Amir. Quando ele me viu ficou surpreso. Ele saía da sala do governador. Eu perguntei: tudo bem? Ele disse: tudo bem, eu vim apenas cumprimentar o governador Flaviano pelo bom relacionamento com o banco. Eu sabia que não era somente isso.
5 Entrei na sala do dr Flaviano Batista e disse que precisava falar sobre a conta que todo mundo falava na cidade. Ele disse: já resolvi isso. Esqueça isso.
6 – Como uma ilegalidade dessas pode ser feita sem a ordem do governador?
Depois de falar essas coisas e eu apenas anotando, Carlos Abrantes revelou uma suspeita sua que parece ser a mais importante e que, se confirmada pela justiça, pode vir a contribuir para alguns esclarecimentos dessa história toda que, a rigor, ainda não foi suficientemente explicada no Acre.
Preste atenção nessa frase de Carlos Abrantes a mim:
7 – Mesmo depois que assumi a fazenda continuaram com a conta Flávio-Nogueira
Tomei um susto no momento. O senhor tá me dizendo que mesmo depois de assumir a fazenda, em substituição a Deusdeth Nogueira, continuaram a movimentar a conta fantasma?
8 – Mesmo depois que assumi. Eu não tinha controle de quando o FPE chegava. Um exemplo: você manda do Acre um dinheiro para a sua mãe que mora no Rio de Janeiro. Ela vai ao banco e este diz que o dinheiro não chegou. Vai no outro dia e o banco diz a mesma coisa. Ela pergunta a você se já mandou o dinheiro. Você diz que sim e você mandou mesmo. Era o meu caso quando ligava para Brasília e perguntava e o ministério dizia que sim. Eu perguntava ao banco do Brasil e este dizia que o FPE não tinha sido depositado. Eu ligava em Brasília, que confirmava que já tinha depositado na conta do Acre. Eu não tinha controle. Só vários dias depois é que era informado de que o FPE havia sido depositado. Então, continuaram a movimentar a conta Flávio-Nogueira mesmo depois que eu estava no cargo.
Na quinta, 11, o ex-secretário de fazenda do Acre, Carlos Abrantes, deixou a UTI, onde estava internado, na cidade de Gumarães. Falei com sua filha Isla, que atendeu, como sempre, muito bem a este repórter e disse que seu pai estava se recuperando da cirurgia.
-Eu li a entrevista (1ª parte) do meu pai pela internet. Só não gostei de ver lá que tinha chorado. Ele anda muito sensível – revelou.
Sobre a cirurgia a que Abrantes foi submetido, informou:
-Foi uma cirurgia muito complicada. Ele teve toda a sua barriga aberta. Essa cirurgia foi tão complicada que o meu pai teve que assinar um termo de responsabilidade no hospital. Os médicos não queriam fazer – contou Isla, que não vê a hora de seu pai esquecer o Acre.
-Eu queria que meu pai esquecesse o Acre. Tudo e principalmente esses fdp que envolveram ele nessa mer…aí – disse revoltada Isla, que é casada, tem filhos, mora no Rio e tirou uma folga para cuidar de Abrantes.
Leitor do jornal OEstado: eu fiz apenas minha obrigação de repórter. Não tenho mais nada a escrever nesse lide. Leia, reflita e faça, você, o seu julgamento ou não
A seguir a última parte da entrevista com o ex-secretário de fazenda do Acre, Carlos Abrantes, concedida com exclusividade ao jornal Oestado, em Portugal.
Entrevista, 2ª parte
OE – Nós conversávamos antes de começar a gravar e o senhor demonstra, quando o assunto é o governo Flaviano Melo, que o senhor foi secretário, uma série de reações tipo ressentimentos, tristeza, revolta etc etc…Eu pergunto: como o senhor tem vivido esses anos todos quando o assunto Flávio-Nogueira, a conta-fantasma que roubava dinheiro da população atrasando o pagamento do funcionalismo, volta e meia entra no seu pensamento?
CA – De todos esses sentimentos que você se referiu eu cito um que ficou de forma mais bem acentuada: que é o sentimento de saudade (neste momento Abrantes começa a chorar. Acende um cigarro. Estamos sentados em cadeiras da estação Campanhã, na cidade do Porto. Passavam das 13h (8 da manhã no Acre)…
CA – Saudade dolorosa mesmo. Não é fácil. Não é apenas difícil, o que seria muito. É impossível você apagar da sua existência 38 anos que eu vivi no Acre. A minha vinculação afetiva com o Acre é tão intensa, tão profunda, tão permanente, que o sentimento de saudade…se sobrepõe a todos os outros. Não tenha dúvida que, em certas vezes, se mistura com essa saudade numa simbiose perfeita, imperfeita, a revolta. É uma sensação de injustiça.
OE – Um amigo convida outro amigo para uma viagem a Brasiléia, na fronteira do Acre com a Bolívia, para comprar cocaína. Ele conta sua intenção para o amigo que, ainda assim, aceita ir nessa viagem perigosa. O senhor conta a mesma história, só que ao inverso. Do sujeito que foi a Brasileia, com intenção de adquirir cocaína na Bolívia, chamou um amigo para ir com ele, mas não contou do seu plano. Disse apenas que era um passeio qualquer. Na volta, os dois são pegos pela Polícia Federal. O senhor poderia explicar essa analogia com a Flávio-Nogueira?
CA – No primeiro caso, o amigo que foi previamente avisado do que iria fazer ele assumiu o risco. E se assume o risco deve-se pagar o preço. Agora no segundo caso, que o amigo não foi avisado que iria ser cometido essa ilegalidade, ele acaba pagando sem dever. Aí o sentimento dele tem de ser de revolta mesmo. E muitas vezes é o meu sentimento.
OE – Por que o seu nome foi envolvido na Flávio-Nogueira? Quem o senhor responsabiliza por isso?
CA – A ética e a política são antagônicas. Raramente a política é ética. E muitas vezes o objetivos que se pretendem alcançar são de tal maneira que vale tudo. E eu tenho a impressão, talvez seja pretensão minha, vaidade minha, que a pessoa a ser alcançada não era exatamente eu. Era por meu intermédio alcançar terceiros, cujos nomes não vou citar em nenhuma circunstancia. Terceiras pessoas essas que, parece, até agora têm se mantidos imunes.
OE – Como secretário de fazenda o senhor recebeu candidatos a governador do Acre que lhe propuseram alguns pedidos estranhos. Que propostas foram essas? Quem foram os candidatos?
CA – Foram pedir coisas, amenidades, na secretaria e eu me recusei a fazer por questão de moralidade e decência…
OE – Que propostas foram essas?
CA – Pedidos de natureza fiscal, envolviam pessoas amigas desses candidatos, que pretendiam que certos ilícitos fiscais fossem esquecidos. Achei que não era correto e me recusei a fazer. E um desses candidatos, que não vou falar, me disse que se fosse eleito eu iria pagar caro por isso. Paguei e estou pagando.
OE – O candidato foi eleito?
CA – Se disser que foi eleito já estaria declinando o nome dele. Nesse caso específico tenho até uma pessoa que assistiu isso.
OE – O senhor confirma que a decisão de envolvê-lo na Flávio-Nogueira foi numa reunião dentro do Palácio Rio Branco? E com participação de figuras muitas conhecidas no Acre?
CA – Tenho informações de fontes fidedignas, seguras e confirmadas com relação a esse fato..
OE – Alguns desses personagens já morreram?
CA – Alguns sim, outros não.
OE – O senhor pretende voltar ao Acre ainda?
CA – Não tenho nenhum sonho ou alento maior do que o retorno ao Acre. Mas o retorno de forma ilibada. Que a verdade seja reconhecida. Resposta: Só nessas circunstancias eu voltarei. Só volto ilibado.
OE – O que senhor sabe do governo Jorge Viana? O senhor acompanha?
CA – Acompanho desde o primeiro mandato.
OE – Qual a impressão aqui de longe?
CA – Acompanho não só pelos jornais, que sempre podemos pôr em dúvida o que os jornais dizem, mas também em função das pessoas com quem converso. Em todos os níveis esse governo tem sido muito positivo para o Acre. Sempre achei. E se algumas pessoas no Acre, indevidamente, colocam na minha boca palavras e posições que nunca disse e nunca tive eu não posso fazer nada daqui. Geraldo Mesquita pode testemunhar. Eu disse a ele o que pensava sobre o governo do Acre atual.
OE – É verdade que o senhor chegou a sugerir ao então governador Flaviano que arranjasse uma vaga de deputado federal pelo PMDB para o então técnico da Funtac Jorge Viana?
CA – O que aconteceu é que minha proposta foi encarada até de certa forma humorística. Na época o engenheiro Jorge Viana ainda não era completamente envolvido com o PT, podia até ter simpatia, e eu sugeri que uma das vagas para deputado federal fosse dada a ele. E alguns cardeais do PMDB da época acharam ridícula a minha proposta que, segundo a opinião deles, que não era a minha, que o Jorge Viana não tinha jeito para a política. Diziam que era um técnico e eu hoje me sinto um tanto quanto orgulhoso de saber que eu é que estava com a razão à época.
OE – O PMDB descartou Jorge Viana?
CA – E se eles tivessem aceitado a minha sugestão e Jorge tivesse sido eleito, provavelmente a história do Acre teria sido outra.
OE – Com certeza….O PMDB está em decadência?
CA – Não só no Acre. O PMDB de hoje não tem nada a ver com o PMDB de Ulisses Guimarães, de Tancredo Neves. Indiscutivelmente o partido tem serviços prestados ao país à época da Ditadura, mas depois que a Democracia se instaurou o partido se esvaziou e eu diria que o PMDB nacional, não apenas o do Acre, não é o PMDB ao qual eu pertenci.
OE – Se o senhor morasse no Acre hoje continuaria filiado ao PMDB?
CA – Com a fisionomia atual é provável que tivesse me desvinculado. Ou se eu achasse que no PMDB, com minha atuação política poderia modificá-lo, o que é muito improvável..o que não quer dizer que eu me filiasse a qualquer partido político. Ficaria, no mínimo, no limbo.
OE – O senhor acha que Flaviano Melo levou o PMDB para o buraco?
CA – Não gosto de atribuir culpas individualizadas. Não acho que o culpado seja o dr Flaviano Batista. Como não acho que seja o ex-senador Nabor Junior. É um conjunto de fatos em nível nacional e que, obviamente, se refletiram no Acre.
OE – O senhor tem contato com Flaviano Melo ou com Nabor Junior?
CA – Com Nabor Junior, sim. Inclusive fui visitado por ele. Mas, coincidentemente, na época em que o professor Geraldo Mesquita estava aqui na minha residência. Com o dr Flavio Batista, nesses 12 anos, nunca falei.
OE – Por que a coincidência do ex-senador Nabor o visitar logo na época da visita de Geraldo Mesquita?
CA – Não sei…foi muita coincidência.
OE – O PMDB temia alguma revelação sua ao ex-governador Mesquita e aí…?
CA – Só sei que foi muita coincidência. Eu disse ao ex-senador Nabor que estava com o professor Mesquita na minha casa e não podia recebê-lo e dar atenção. Nabor me ligou quando já estava em Portugal.
OE – O senhor se sente abandonado por Flaviano Melo?
CA – Nunca consegui falar com ele nesses 12 anos. Não que eu não tivesse tentado várias vezes falar com ele. Mas sempre ele estava ocupado ou com pessoas do senado e não podia atender ao telefonema.
OE – Qual o motivo de nunca Flaviano querer falar com o senhor nesses 12 anos?
CA – Só ele pode responder a essa pergunta. O resto seria especulação da minha parte e eu não faço. Esta pergunta teria que ser feita a ele.
OE – Isso é uma surpresa não só para mim, mas para todo o Acre o fato de o senhor não conseguir falar com Flaviano nos últimos 12 anos.. Com o homem que lhe indicou para secretário de fazenda do governo dele. O senhor foi deixado de lado?
CA – Isso seria atribuir-me demasiada importância achar que um senador da república ou ex-governador teria que ligar para mim.
OE – Mas não seria normal receber – ou atender – um telefonema de um ajudante importante do governo? Seria o mínimo razoável, não?
CA – Talvez na sua ou na minha concepção fosse razoável, mas não na dele. Agora com relação a telefonemas eu registro que recebi centenas de telefonemas, alguns anônimos. Alguns deles me ameaçando. Alguns aconselhando que retornasse ao Acre. Outros exigindo que não fosse.
OE – O que diziam essas ameaças?
CA – Que não convinha que eu fosse no Acre, que o momento era tenso. Porque tantos ‘acidentes’ aconteciam no Acre, como aconteceu como o governador Edmundo Pinto (morto num hotel em São Paulo), como aconteceu com o Wandervam, da Cohab (assassinado em casa), como aconteceu não sei com quem do Sindicato de Brasileia, como aconteceu com Chico Mendes, de Xapuri, e que era melhor eu ficar por aqui até que as coisas acalmassem. E quando eu via nos jornais membros do MP ameaçados, o próprio governador tinha uma guarda de segurança, obviamente, que eu ficava intimidado. Sempre ficava nessa dúvida de voltar e não voltar e acabava não voltando.
OE – Não foi a primeira vez que o senhor teve que sair do Acre assim meio a contragosto . Na época da Ditadura, forçou o seu primeiro ‘exílio’. Como foi? Foi no governo Kalume?
CA – Foi num desses governos da Ditadura (governo Kalume). Saí com 3 filhos. Eles tinham 3, 2 e 1 ano de idade. E durante quatro anos fiquei no Rio de Janeiro. Com dificuldades econômicas. Mas naquela época os tempos eram outros. Você tinha que conviver com isso. Eu convivi, não me adaptei, mas convivi.
OE – Que ideia o senhor faz do Acre hoje? O que acha que tá acontecendo por lá?
CA – Veja bem. Eu tenho uma saudade infinita. Imensa e incontrolável pelo meu Acre. Eu não sei se o Acre atual corresponde ao Acre antigo de que eu me lembro. Acredito que o Acre não pode parar. Tem progredido, evoluído, desenvolvido e vai continuar assim. É o que espero do Acre. É o que sonho. Os problemas de desempregos não são problemas só do Acre. São problemas planetários. Antigamente trabalhar era obrigação. Hoje é privilégio.
OE – O senhor acha que o emprego está em extinção no mundo? O chamado emprego fixo?
CA – Gramsci dizia que o mundo da política e da sociedade é pendular. E este pêndulo oscila de um extremo a outro. Hoje foi eleita a competitividade, a produtividade, como sendo elementos básicos e fundamentais para o progresso das sociedades. E esqueceu-se do princípio que, ao meu ver, está acima de todos eles, que é o da solidariedade. E essa competição levará a uma situação de que o número de empresas no mundo será cada vez menor e maior será a concentração de riquezas e poder. E essa competitividade das empresas se transfere para as pessoas e depois para os estados. Essa ideia é uma ideia totalmente equivocada. E há de se lutar contra ela. E vai chegar um tempo que a sociedade não aceitará isso passivamente, como tem sido até agora. E nós teremos que retomar a utopia.
OE – Que medidas está tomando para restabelecer a sua inocência no processo da Flávio-Nogueira?
CA – Estou trabalhando nesse sentido, mas sem êxito. As medidas legalmente cabíveis, no sentido de repor a verdade. Se vou conseguir isso ou não é uma incógnita que coloca todos os dias, horas, na minha frente.
OE – O senhor se sente traído pelos companheiros de governo, os secretários de sua época?
CA – Não. Não tenho queixa nem amargura com nenhum dos companheiros de governo.
OE – Que mensagem o senhor diria para o povo do Acre nesse finalzinho de entrevista?
CA – Eu acho que o Acre é mais importante que todos nós individualmente considerados. O Acre, como unidade jovem da federação brasileira, tem que estar acima dos interesses políticos, partidários, empresariais menores. A partir do momento em que todos os acreanos elegeram o Acre como objetivo final e fundamental pode ter a certeza de que vai em frente. Porque no Brasil inteiro o Acre é o único que tem uma história própria. E isso tem que ser valorizado. A Revolução que foi feita com armas na mão tem que continuar hoje. Embora sem armas. Com compreensão, trabalho, união e com crença.
OE – Seu Abrantes, estamos aqui na cidade do Porto, norte de Portugal, na estação Campnhã, são 14h15min (9h15min no Acre). Daqui a pouco tenho que pegar o trem de volta a Lisboa e depois sigo para a Espanha. Gostaria de chamar o senhor para seguir viagem comigo rumo ao Brasil, ao Acre. Eu posso até chama-lo, mas o senhor não pode ir. Não se sente seguro em pisar no nosso país…
CA – Engano seu. Eu estou seguindo com você. Só não estou seguindo em termos físicos. Você vai levar um pouco de mim com você. O meu pensamento não está só com você, está especialmente com você, mas está com o Acre inteiro. Especialmente de quem eu gosto. Com meus amigos e até com meus inimigos, que suponho que tenho. Devo ter. Mal de mim se não tivesse…
OE – É a primeira vez que o senhor concede uma entrevista para um jornal do Acre?
CA – Eu estou abrindo o coração. Estou confidenciando com você. Esses assuntos do Acre eu tenho certa dificuldades em abordá-los com quem quer que seja porque estou completamente fora do contexto, não teria nem condições de entender. E com você, não. Nós nos conhecemos, você me conhece, privamos…você sindicalista e eu no governo. Divergimos muitas vezes, mas sempre dentro de um clima de entendimento, de civilidade, educação, cada um defendendo os seus interesses… é óbvio, estávamos em campos opostos… então você vai levar um bocado de mim. Essa abertura que tive com você, vou lhe dizer, nunca tive com ninguém. Mesmo aqui em Portugal. Eles não entenderiam da minha ligação afetiva, quase telúrica, com o Acre.
OE – Obrigado pela entrevista.
Em tempo: a música que marcou essa viagem…Os Tribalhistas com Marisa Monte, Arnaldo Antunes e Carlinhos Brown… Velha infância…Visitava o Elevado Santa Helena(Lisboa) e no bar, quando tomava um suco de laranja(3 Euros), tocou no rádio essa música…ficou para sempre…Também havia na minha mala esse CD dos Tribalistas, que dei a um motorista de táxi em Londres…mas essa é outra história que já contei aqui.